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política nacional

Artigo: Líderes velhos em tempos novos

PRI-2002-OPINI -  (crédito: Maurenilson Freire)
PRI-2002-OPINI - (crédito: Maurenilson Freire)
André Gustavo Stumpf
postado em 20/02/2023 06:00

ANDRÉ GUSTAVO STUMPF - Jornalista (andregustavo10@terra.com.br)

O ex-presidente Jair Bolsonaro declarou ao jornal norte-americano Wall Street Journal que pretende voltar ao Brasil no início de março próximo. Seu provável retorno, se ocorrer, vai completar a cena política nacional inconclusa desde o golpe mal-sucedido ocorrido em 8 de janeiro e antecedido pela estranha fuga do ex-presidente para Kissimee, vilarejo próximo a Orlando, nos Estados Unidos, onde se situam os grandes parques temáticos do mundo Disney.

Bolsonaro obteve mais de 57 milhões de votos na última eleição. Apesar dos pesares, das loucuras, das frases mal colocadas, da tentação autoritária, da proteção ostensiva a filhos e amigos, além de sua aversão ao trabalho, ele conseguiu resultado expressivo, combinado com o vigoroso antipetismo que viceja na população brasileira, sobretudo na classe média. Deve ser visto, em condições normais, como um personagem importante na política nacional.

Acontece que seu radicalismo, misturado à falta de projeto e incapacidade de refletir sobre os grandes temas nacionais, o afastaram dos representantes do que poderia ser chamado de centro-direita. E dos conservadores na política e liberais na economia. Esse pessoal não pretende patrocinar, nem apoiar golpe de Estado. Também não quer se aliar a militares golpistas que ainda têm uma visão de país moldada sobre a antiga realidade da guerra fria. Alguns militares do Exército tentaram produzir um livro branco sobre as ações da força que terminou não sendo publicado oficialmente. Mas circula de maneira quase clandestina com o título Orvil, tentativas de tomada do poder. O título é "livro" ao contrário.

Esse grupo é o mesmo que apoiou o quase golpe de Estado, permitiu que bolsonaristas fizessem acampamentos na frente de instalações militares e tentaram, com mensagens subliminares, inspirar golpistas que se engajaram na aventura de atacar os prédios do Congresso Nacional, da Presidência da República e do Supremo Tribunal Federal. Os principais expoentes dessa turma, no meio militar, estão sendo ultrapassados no sistema de promoções dentro da Força sob o governo Lula. Alguns vão remanescer, mas o principal grupo vai para a reserva, onde, aliás, viceja a oposição ao governo eleito em outubro passado.

As forças político-partidárias estão se organizando no Congresso Nacional. A oposição, em tese, tem a maioria, mas, na prática, é muito difícil lutar de maneira continuada contra a avassaladora força do governo federal. Os blocos e as federações vão se formar pela ordem natural das composições em torno de governo e oposição, sempre segundo interesses objetivos. Não há espaço para ideologias e amadorismo no cotidiano da atividade parlamentar. É nesse momento que a presença do ex-presidente Bolsonaro pode ter alguma influência sobre a atuação de deputados e senadores. A força originária dos militares tende a se reduzir depois da profunda frustração com o fracasso da tentativa do golpe de Estado.

O presidente Lula conseguiu encontrar um lugar para Dilma Rousseff. Ela é um problema para o governo do PT. Sua administração foi catastrófica para o país, jogou a economia brasileira em recessão profunda consequência de equívocos monumentais na condução da política econômica. E se concluiu com as famosas pedaladas fiscais que lhe custaram o mandato. Isso ocorreu em paralelo com as investigações promovidas pela Operação Lava-Jato. Agora, os dois momentos foram vencidos. Dilma Rousseff em Shanghai, na China, na presidência do Banco dos Brics, não vai mais atrair problemas, nem provocar discussões. Ela ficará longe do Brasil. O debate sobre legalidade de seu impeachment, conduzido pelo ministro Ricardo Lewandowski, nomeado para o STF por Lula, perderá o sentido. Um problema a menos para Lula.

Os brasileiros vão descobrir se existe bolsonarismo. Ou se o coletivo perdeu o sentido pela falta de protagonismo de seu líder e da hesitação manifestada em momentos que exigiram decisão. Se o ex-presidente não assumir sua possível liderança, novos nomes deverão surgir na centro-direita brasileira, de maneira mais civilizada e menos agressiva. Ou seja, movimentos mais ou menos conectados com similares europeus. Nada parecido com a grosseria e com o palavreado chulo do ex-presidente.

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