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Opinião

Artigo: O retorno aos anos de chumbo

O que temos observado é uma verdadeira violência aos direitos dos contribuintes, que terão de recorrer ao Judiciário, arcando com novas custas e garantias judiciais

Juros. Calculadora. Economia. Taxa básica. Selic -  (crédito: Wanderlei Pozzembom/CB/D.A.Press)
Juros. Calculadora. Economia. Taxa básica. Selic - (crédito: Wanderlei Pozzembom/CB/D.A.Press)
postado em 13/02/2023 06:00

MÍRIAN LAVOCAT — Advogada, é conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Distrito Federal

Estamos regredindo no tempo? Atravessamos um período em que muito se fala sobre a consolidação da democracia brasileira, no entanto a sensação que temos é de estarmos voltando aos anos de chumbo, pelo menos na política fiscal. Nossa impressão é de que poderemos adentrar uma época obscura na seara tributária.

Em meados de janeiro, o governo anunciou um pacote de medidas com o objetivo de melhorar a situação fiscal brasileira e reduzir o rombo nas contas públicas. Entretanto, as medidas provisórias propostas trazem um peso excessivo aos contribuintes. Além do retorno do voto de qualidade pró-Fazenda, lançam uma escuridão sobre a existência e importância do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), um tribunal centenário, que apresenta sólidos resultados na redução de litígios tributários e aduaneiros na esfera administrativa e, consequentemente, na judicial, habitualmente citados em julgados do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.

Aos empresários, vem sendo novamente colocada a pecha de sonegadores como se fossem eles os culpados pelo rombo nas contas públicas, olvidando-se, de forma proposital e contumaz, de pagarem os tributos. A realidade, entretanto, é inversa, eis que o empresário brasileiro não quer se eximir de suas responsabilidades ou sonegar tributos. O que quer é uma tributação justa, a garantia ao direito constitucional da ampla defesa e ao contraditório, além de mínima segurança jurídica, que permita o planejamento necessário ao desenvolvimento das suas atividades.

O que temos observado é uma verdadeira violência aos direitos dos contribuintes, que terão de recorrer ao Judiciário, arcando com novas custas e garantias judiciais, congestionando ainda mais aquele poder, mesmo que tenhamos experienciado, nos últimos anos, a melhora no ambiente fiscal, proporcionando recordes de arrecadações.

Assusta, ainda, que nas propostas anunciadas pelo novo governo federal não se ouça falar em reduzir custos do Estado, em enxugar a máquina pública. Muito pelo contrário, o que tivemos foi um salto de 23 para 37 ministérios. Das novas medidas até agora divulgadas, apenas duas remetem ao corte de despesas públicas e contenção de gastos da máquina governamental.

Há de se falar ainda sobre a forma utilizada para as novas regulamentações. A utilização de medidas provisórias como ferramentas para essas alterações acaba por retirar da sociedade brasileira o direito ao debate. A ausência do processo legislativo regulamentar veta o amplo e democrático espaço de discussões promovido pelas casas legislativas, eleitas democraticamente, e com a devida representatividade a elas conferida pelo povo brasileiro.

Ademais, a utilização do instrumento precário ainda se torna mais preocupante. Na semana dos mais repudiáveis atos contra o Supremo Tribunal Federal, que levaram à indignação dos brasileiros e do mundo democrático, tivemos, entre outras medidas, a edição da MP nº 1160/2023. A Suprema Corte, pela maioria dos seus ministros integrantes, no julgamento da ação direta de inconstitucionalidade nº 6399, em 24 de março de 2022, formou entendimento pela inconstitucionalidade do voto de qualidade contrário ao contribuinte, nos casos de empate nos julgamentos dos processos administrativos, instaurados pelo fisco federal. Parece-nos que a supremacia das decisões do STF não foi levada em conta quando da edição da medida provisória acima mencionada.

Enfim, é o desejo comum de todos nós brasileiros que o país continue a crescer, consolidando-se como economia pujante perante o mundo, mas não podemos eleger o empresariado brasileiro, já asfixiado com a brutal carga tributária como vilão e único responsável para tanto, ainda mais depois de anos dificílimos, ocasionados pela pandemia da covid-19, que nos empurrou para uma crise econômica e humanitária sem precedentes.

Uma política fiscal justa, clara e consistente, sem colocar sobre os ombros dos contribuintes todo o peso; uma responsabilidade fiscal efetiva e austera, bem como reformas tributária e administrativa, amplamente debatidas com a sociedade e colocadas em prática, são, sem sombra de dúvida, o melhor caminho para consolidarmos o Brasil com todo o seu potencial entre as maiores potências mundiais. Sem anos de chumbo.

Viva a democracia plena.

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