LUCIANA NICOLA - Diretora de Relações Institucionais e Sustentabilidade do Itaú Unibanco
O Brasil é um país reconhecido mundialmente por sua diversidade racial: somos o resultado da mistura entre várias nacionalidades, etnias e raças. E, embora os negros sejam a maioria da nossa população — 55,8% dos brasileiros, de acordo com dados do IBGE/2022 —, esse percentual não se reflete em diversos campos sociais, como nas universidades, no mercado de trabalho formal, nas posições de liderança dentro das empresas, na política, entre outros exemplos.
O racismo estrutural é uma herança amarga que, infelizmente, persiste até hoje, com resultado muito visível nas diferenças entre oportunidades para brancos e negros ao longo da vida. E ele precisa ser combatido de forma sistêmica. Uma das conquistas mais relevantes nesse sentido é a Lei 12.711/12, conhecida pela sociedade como Lei de Cotas. Ela destina 50% das vagas em universidades e em institutos federais a jovens que estudaram integralmente em escolas públicas, além de reservar cotas para estudantes pretos, pardos e indígenas (PPI).
Em 2022, a Lei de Cotas celebrou 10 anos de existência, demonstrando a importância desse instrumento de inclusão na trajetória educacional e de vida para muitos jovens. Mas revelou que, embora seja fundamental que ela avance e se fortaleça cada vez mais, existem desafios urgentes que precisam ser enfrentados. Entre eles, destaco a comprovada dificuldade que os cotistas têm para concluir os estudos. Por meio dos programas de auxílio que apoiamos, observamos que muitos deles não possuem recursos para materiais didáticos, moradia, alimentação, transporte, internet, entre outras dificuldades.
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Entendendo que arcar com esses custos não é uma tarefa fácil, o Itaú Unibanco apoiou a criação de um programa piloto em 2018, em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), oferecendo inicialmente 90 bolsas-auxílio para alunos cotistas de diferentes cursos de graduação e um estudo de impacto dessas bolsas, liderado por Marta Arretche, professora titular do Departamento de Ciência Política da USP e diretora do Centro de Estudos da Metrópole, da Fapesp. Os resultados foram animadores: durante o programa, a evasão escolar registrada entre os bolsistas foi de apenas 2%, contra 24% dos alunos cotistas que não receberam a bolsa — considerando a totalidade dos alunos entrantes no período, o percentual foi de 20%.
Ao longo dessa trajetória, observamos, também, que o desempenho escolar dos bolsistas tende a ser superior. Analisando a performance de 11.035 alunos que ingressaram na USP em 2018, os 90 jovens escolhidos por sorteio para receber as bolsas, oriundos da Lei de Cotas, registraram médias de desempenho acadêmico maiores que as apresentadas pelos alunos não cotistas. No geral, o desempenho, no segundo semestre de 2018, desses bolsistas ficou muito próximo do grupo geral de alunos cotistas (um pouco abaixo de 7). Mas, já no primeiro semestre de 2019, a nota já sobe e ultrapassa 8; acima, inclusive, dos demais estudantes da universidade, que não necessariamente estudaram em escolas públicas ou entraram pela Lei de Cotas. Em 2022, esse piloto deu origem ao programa USP Diversa.
O apoio à melhoria do sistema educacional no Brasil é um tema prioritário para o Itaú Unibanco e nossas ações se materializam por meio dos nossos braços sociais, além de iniciativas diretas do banco. Há mais de 40 anos atuamos no fortalecimento do sistema público de ensino, visando à transformação social e o desenvolvimento sustentável do país.
Essas constatações nos motivaram a lançar um programa com potencial de impacto ainda maior: o Potências — Programa de Bolsas de Permanência Universitária do Itaú Unibanco, com investimento de R$ 25 milhões do Itaú em 2022 para financiar estudantes cotistas em universidades públicas do Brasil e ajudá-los a permanecer e concluir sua graduação. Apoiando cotistas pretos, pardos e indígenas, o programa intenciona contribuir para a diminuição das desigualdades raciais, gerando impacto positivo de longo prazo para a sociedade.
Iniciando oficialmente em dezembro de 2022 e desenvolvido com apoio de importantes pesquisadores em educação, equidade racial e em investimento social privado, o Potências oferece uma bolsa financeira de R$ 964 mensais a mais de 350 estudantes ingressantes da Lei de Cotas em universidades federais convidadas a participarem do programa. E esse é apenas o começo.
Meu desejo é que o Itaú Unibanco, como precursor desse movimento, inspire outras empresas a também compreenderem seu papel nessa construção coletiva, com benefícios para toda a sociedade. Além de apoiar bolsistas na conclusão dos estudos, vamos criar uma ferramenta de acompanhamento da taxa de evasão e de desempenho dos estudantes, que permitirá às instituições de ensino superior terem dados dos impactos das ações afirmativas, indicadores que podem orientar a adoção de políticas públicas que atuem pela equidade racial na educação brasileira. Acreditamos na potência do trabalho conjunto entre iniciativa privada, com apoio do terceiro setor e atuação do governo, construindo caminhos com potencial para transformar o Brasil.