LUCIANO NAKABASHI - Doutor em economia e professor associado da Fearp/USP
A regra do teto de gastos tem apresentado problemas, mas ela vai na fonte de um dos principais problemas da economia brasileira, que é a trajetória da relação dívida pública/PIB, focando no lado das despesas públicas que têm crescido de forma sistemática desde a Constituição de 1988.
Para retomar uma trajetória de crescimento sustentável, uma das condições necessárias é a implementação de regras que coloquem em trajetória de queda a relação dívida/PIB, pois ela é essencial para controlar a taxa de juros e reduzir incertezas, favorecendo o investimento produtivo nacional ou estrangeiro. Com as instabilidades geradas por regimes autocráticos como Rússia e China, abrem-se ainda mais oportunidades de investimento em países como México e Brasil, desde que haja previsibilidade e bons fundamentos econômicos.
Para o controle da relação dívida/PIB, o foco deve ser no controle das despesas, pois a carga tributária é bastante elevada no país, onerando o funcionando do setor privado e, dessa forma, sua competitividade, além de ineficiências consideráveis em termos de bem-estar social. Outro ponto relevante de uma regra que controle os gastos públicos é forçar um debate sobre quais as prioridades do país. Quando ocorre uma demanda por aumento de gastos em determinada modalidade, é preciso discutir com outros segmentos da sociedade onde os cortes deverão ocorrer para fazer frente à nova despesa. É claro que os grupos econômicos e políticos com maior força tendem a levar vantagem. Por isso, é preciso sempre considerar mecanismos para contrabalancear a correlação de forças, sobretudo em favor das classes de renda mais baixas.
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Certamente, teremos que realizar reformas estruturais para controlar a trajetória da dívida pública em relação ao PIB, visto que mais de 90% dos gastos são direcionados para despesas obrigatórias, sobrando pouco espaço para cortar gastos, visto a necessidade de manter o funcionamento da máquina e os investimentos públicos. Talvez a falta de uma agenda de reformas estruturais para controlar o aumento dos gastos que deveria ter sido implementada antes da criação da regra do teto de gastos seja a principal razão para a dificuldade em sua manutenção atualmente.
Considerando a importância das reformas, sobretudo aquelas que desvinculem gastos que estão automaticamente vinculados às receitas públicas, além de uma nova rodada de reforma da Previdência, incluindo as classes que ficaram de fora da anterior, é preciso associar a essa agenda uma nova regra que controle os gastos públicos para melhorar os fundamentos da economia brasileira e, dessa forma, estimular o seu crescimento.
Uma nova regra do teto de gastos precisa ser mais flexível e permitir que as despesas aumentem mais do que a inflação passada em períodos de baixo crescimento econômico e que cresçam de acordo com ela quando a elevação do PIB for maior que 2,5% ou 3% ao ano, por exemplo. Nos momentos de baixo crescimento, é preciso aumentar os gastos públicos pela existência de estabilizadores automáticos e para estimular a economia de forma ativa. No entanto, para que isso seja possível, nos momentos de crescimento mais robusto, é preciso melhorar a situação fiscal de forma a reduzir a relação dívida/PIB.
O grande desafio de tal regra é estimar o crescimento do PIB para a elaboração do orçamento público. Mesmo no horizonte de um ano, os desafios são enormes e os erros de estimativa são a norma. Por isso, tal regra do teto precisa considerar o crescimento do ano anterior e possuir gatilhos de aumento ou corte de gastos caso o crescimento econômico do ano em questão seja muito diferente do ano anterior, pelo menos quando a economia passa por um processo de desaceleração econômica em relação ao ano anterior.
O controle das contas públicas é um pré-requisito para a retomada do crescimento econômico de forma sustentável, sobretudo pelo controle dos gastos e por meio de políticas econômicas que melhorem a sua eficiência. Pelo nível de desenvolvimento econômico em que o país se encontra, políticas que estimulem o crescimento são fundamentais para redução da pobreza e ganhos de bem-estar para nossa sociedade.
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