A construção antidemocrática protagonizada pela extrema-direita foi fortalecida, em grande medida, pelo surgimento do bolsonarismo. A face violenta desse projeto tem sido construída com ações simbólicas e medidas concretas. Destaca-se, no âmbito simbólico, a profissionalização de um gabinete de desinformação no próprio Palácio do Planalto para destruir personalidades, desafetos políticos e inventar narrativas mentirosas.
No que diz respeito a ações concretas, merece destaque o conjunto de medidas de aparelhamento extremo das Forças Armadas, que têm tendências direitistas históricas e amargam até hoje o gosto do fim de sua era ditatorial no poder. Além disso, houve a adoção de uma política de armas irresponsável, com estímulo explícito ao armamento de seu grupo político.
No entanto, os esforços empregados não foram suficientes para impedir a derrota eleitoral e política da extrema direita em 2022. Foram derrotados nos dois turnos das eleições presidenciais. E a derrota política se deu na trama de um terceiro turno, quando a extrema-direita buscou se articular nos bastidores com setores das Forças Armadas para não reconhecer o resultado das eleições e tentar impedir a posse do presidente Lula.
Desistiram, pois as consequências seriam dramáticas. O Brasil seria desplugado imediatamente do sistema internacional e teria uma onda interna de resistência democrática brutal. Afinal, Lula teve 60 milhões de votos. Somado a isto, praticamente todas as forças institucionais e econômicas relevantes não compraram a ideia. A minuta de decreto golpista, encontrada na casa do ex-ministro de Bolsonaro Anderson Torres, reforça a suspeita de boa parte dos brasileiros.
Mas o intento golpista não morreu, não foi combatido por Bolsonaro e foi, na verdade, constantemente alimentado. Militares da reserva, até da ativa, e lideranças bolsonaristas incentivaram os acampamentos dos quartéis generais do exército brasileiro com uma única pauta: exigência de golpe de estado. O mantra repetido era que Lula não subiria a rampa.
Os protestos que no seu DNA eram autoritários e tinham uma pauta simbolicamente violenta não podiam virar outra coisa que não uma indústria a céu aberto de golpismo e terrorismo contra as instituições. O primeiro recado foi em 12 de dezembro, com ações absolutamente criminosas em Brasília resultado da diplomação de Lula. As ameaças terroristas não cessaram e o natal não foi em paz com diversas denúncias de bomba, incluindo um planejamento de explosão de caminhão inflamável nas proximidades do aeroporto de Brasília.
Importante registrar que tudo isso veio acompanhado de omissão ou "minimização" por parte das autoridades bolsonaristas ainda no poder federal. E da mesma forma as autoridades locais relutaram em tratar os "patriotas" como uma célula golpista que podia recorrer a atitudes extremas. A irresponsabilidade do governador Ibaneis Rocha era tamanha que ele escolheu nada menos que Anderson Torres para assumir a Secretaria de Segurança no quintal de Lula, ameaçado de golpe. Ibaneis pode até não ser um conspirador pró-golpe mas está longe de não compreender as consequências políticas de suas escolhas.
O dia 8 de janeiro de 2023 marcou a chegada do momento de maior radicalismo e tensão que a minha geração assistiu na política brasileira. Bolsonaristas se organizaram nos QGs do país para marcharem à Brasília e abertamente mudaram o tom, dessa vez dizendo que vão usar a força necessária. Convocam atiradores esportivos, militares da reserva e muita gente lunática capturada pela seita fascista vai às ruas. O que o governador do DF faz?
Sinaliza para a imprensa que a Esplanada é espaço livre para manifestações, como se estivesse lidando com um ato por pautas legítimas e com uma convocatória pacífica. As autoridades sabiam dos conteúdos que circulavam nos grupos. E tenho tranquilidade para afirmar que há uma rede criminosa de omissão e prevaricação em diferentes níveis do poder público. Aqueles que eventualmente tenham atuado de forma omissa sem dolo também têm responsabilidade com as consequências para a democracia.
Dessa forma, o afastamento do governador e as prisões realizadas de mais de 1200 pessoas são medidas necessárias para colocar fim ao ímpeto golpista no Brasil. O problema não é a depredação do patrimônio público em larga escala, mesmo que isso já seja muito grave. Especialistas em patrimônio histórico têm confidenciado que o prejuízo total pode ficar acima de um bilhão, se mapeados todos os danos físicos, artísticos, patrimoniais, tecnológicos e históricos.
Mas a questão ainda mais grave é a tentativa descarada de golpe de estado. Defender investigação e punição rigorosas é um dever cívico porque se trata de um crime grave contra a alma da democracia que é a nossa liberdade. Afirmo sem medo que a verdadeira pacificação só virá sem anistia!
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