"É tudo novo de novo/ Vamos nos jogar onde já caímos/ Tudo novo de novo/ Vamos mergulhar do alto onde subimos". A canção de Paulinho Moska que dá nome a este texto reflete o que senti, no primeiro dia do ano, ao presenciar a conversa de dois homens, sentados em uma calçada no Guará. Segundo um deles, é bobagem comemorar a virada de ano, porque, afinal, vai ser tudo novo de novo. "Até mesmo o primeiro dia útil do ano cai numa segunda-feira, o que há de especial nisso?", ele resmungava.
A cada quatro anos, existe uma sensação de mudança efetiva por conta da troca de poder. E, nesse 1º de janeiro de 2023, especificamente, Brasília esteve dividida entre o clima de celebração pela posse de Lula e de luto pela despedida de Bolsonaro. De um lado, o choro — já sem muito alarde — dos manifestantes que acreditavam na anulação das eleições ou na tomada arbitrária do poder e, frustrados, estão abandonando a cidade. Do outro, milhares de brasileiros se apossaram, de forma robusta e orgulhosa, da capital do país para vivenciar o momento histórico de um ex-presidente, que foi preso de forma equivocada, a subir a rampa pela terceira vez.
A transição de faixa presidencial foi simbólica, efetivada pelas mãos de uma mulher preta e do povo, substituindo o antigo ocupante do Planalto. Com esse ritual catártico, veio a insígnia do início de nova era, ou do recomeço do que vimos como novidade algumas décadas atrás: o resgate da democracia perdida e a retomada do crescimento econômico brasileiro, com respeito à Constituição e apreço pelo desenvolvimento social. Algumas lacunas serão preenchidas, fragmentos serão encaixados. Todavia, não quer dizer que, como em um passe de mágica, tudo passará a ser esplendoroso. Há muito, ainda, a se trabalhar. Só estamos recomeçando.
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De fato, o Brasil mudou no domingo. Porém, grosso modo, o homem do Guará não está errado. Para o cidadão comum, apolítico, iniciou mais um janeiro, que logo será substituído por outro fevereiro, e assim caminhamos... Mas, independentemente da consciência política, a gente precisa se sustentar na beleza da esperança. É necessário contemplar, sim, a poesia que envolve cada rito de passagem. A Terra deu uma volta completa em torno do sol, afinal. Ciclos foram concluídos e novos serão enredados. Não foi apenas um sábado que se tornou mais um domingo. Entramos em um novo ano, e ele vem abarrotado de realidades e esperanças. O aumento do salário mínimo passou a valer. Um grupo de pessoas ganhou uma bolada de R$ 540 milhões na Mega. Outra pessoa decidiu parar de fumar. Algum apaixonado foi pedido em casamento na virada. Teve gente decidida a praticar exercícios físicos a partir dessa segunda-feira. E há quem conseguiu, enfim, deixar em 2022 — leia-se semana passada — todo o sofrimento que carregava há anos.
Ufa! Há, sim, uma grande representatividade nesse alvorecer. É gostoso recomeçar, sempre que for preciso. Nem que seja para fazer tudo de novo.
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