Opinião

Visão do Correio: Informação e vacina contra novos erros

Iniciada em 18 de janeiro de 2021 — em clima marcado por desinformação, difusão de notícias falsas, hesitação oficial e declarações vindas do Planalto que não contribuíam exatamente para encorajar a busca pela proteção —, a vacinação no Brasil, lembram os autores do estudo, avançou aos poucos

Que vacinas salvam vidas, especialmente em um cenário de pandemia como o enfrentado diante da covid-19, não há dúvida do ponto de vista da comunidade científica, e parece ser também uma percepção que sobressai do cenário de desinformação — inclusive difundida por autoridades — que marcou a chegada ao Brasil dos primeiros imunizantes contra o coronavírus. Mas um estudo de pesquisadores brasileiros considerando o período mais crítico da crise sanitária no país, de janeiro a agosto de 2021, em que ocorreu o pico de casos fatais, dá números a essa percepção, em uma análise que traz alento, mas também alerta.

Em artigo publicado na revista científica The Lancet Regional Health Americas, cientistas da Fundação Oswaldo Cruz, do Observatório Covid19 BR, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), da Universidade Federal do ABC (UFABC) e da Universidade de São Paulo (USP) quantificaram o número de vidas da parcela mais vulnerável da população salvas pela vacina nos primeiros oito meses do ano passado. Chegaram, em uma estimativa considerada conservadora, à conclusão de que os imunizantes pouparam da morte entre 54 mil e 63 mil brasileiros acima dos 60 anos. No mesmo período, calculam os pesquisadores, de 158 mil a 178 mil deles deixaram de sofrer com internações e ocupar leitos na saturada rede de hospitais brasileiros.

Esse é o dado que permite ao Brasil saudar o que é classificado como o maior programa de vacinação da história do país. Deve também servir de espelho para conscientizar quem ainda conserva alguma dúvida sobre a importância da imunização, não só contra a covid-19, mas contra todas as doenças para as quais há proteção disponível. Tantas vidas salvas e tanto sofrimento poupado de milhares de famílias de fato é motivo de orgulho para um esforço que já aplicou quase meio bilhão de doses entre as várias faixas da população, apenas contra o coronavírus.

No entanto, outra vertente do estudo chama a atenção exatamente para a parte do programa de vacinação anticovid que jamais deve ser esquecida, sob pena de se repetir. Da mesma forma que quantificou as vidas poupadas, o estudo projetou quantas pessoas poderiam ter sido salvas caso a imunização em massa tivesse começado em ritmo mais acelerado, como ocorreu de quatro a oito semanas depois do começo das aplicações.

Iniciada em 18 de janeiro de 2021 — em clima marcado por desinformação, difusão de notícias falsas, hesitação oficial e declarações vindas do Planalto que não contribuíam exatamente para encorajar a busca pela proteção —, a vacinação no Brasil, lembram os autores do estudo, avançou aos poucos. Foram 250 mil doses/dia alcançadas entre fevereiro e março; 500 mil doses diárias entre abril e maio; e 1 milhão a cada 24 horas apenas em junho de 2021.

Segundo o estudo, se o ritmo das aplicações fosse mais acelerado, o número de mortes de idosos poderia ter sido até 50% menor em relação àquele observado no pico da variante Gama do coronavírus, coincidente com a dramática crise sanitária em Manaus, que chocou todo o país. As estimativas indicam que, com uma campanha mais intensa, outras 47 mil vidas de idosos poderiam ter sido poupadas. Além disso, aproximadamente 104 mil hospitalizações teriam sido evitadas — nesse segundo cenário, com uma economia calculada em algo como US$ 1,24 bilhão, considerando que cada pessoa hospitalizada durante a pandemia teve um custo médio estimado no Brasil em US$ 12 mil.

Os dados do estudo servem como alerta em um cenário no qual novo avanço de casos de covid-19 encontra denúncia de descontrole em relação à vacinação e aos estoques de imunizantes, feita por integrantes da equipe de transição do governo eleito — embora negada pelo Ministério da Saúde. Polêmicas à parte, é fato que cidades como Belo Horizonte se encontram com a aplicação da quarta dose estagnada por falta de vacinas, segundo a prefeitura, ao passo que no Brasil apenas 7% das crianças de 3 e 4 anos tomaram as duas doses preconizadas. Situações muito preocupantes para um país que já teve tempo de sobra para aprender com as estatísticas de seus erros.

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