Arthur Trindade M. Costa - Professor de sociologia da Universidade de Brasília e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal
No sábado, véspera do Natal, o país tomou conhecimento do plano para execução de um atentado terrorista,com o objetivo de tumultuar a mudança de governo. A ideia era explodir um caminhão-tanque na área do aeroporto de Brasília. O atentado visava causar caos a fim de propiciar as condições para decretação de Estado de Sítio. Por sorte, o plano foi frustrado pelo motorista que desconfiou do pacote colocado num dos eixos do caminhão. A Polícia Militar foi acionada e a bomba retirada.
A Polícia Civil conseguiu, rapidamente, capturar o terrorista. Trata-se de George Washington de Oliveira Sousa, dono de postos de combustíveis no interior do Pará, que veio a Brasília para participar dos protestos na frente do QG do Exército. No apartamento, alugado por Sousa, foram encontrados fuzis, pistolas, munições e explosivos. Segundo o depoimento do empresário, a intenção era distribuir o armamento entre os membros do acampamento. Ele também confirmou a participação de outras pessoas no planejamento do atentado.
O que chama a atenção no episódio não é a surpresa, mas ao contrário a previsibilidade do atentado. Há quase dois meses, centenas de pessoas estão acampadas na porta de quartéis exigindo intervenção militar para anular as eleições e impedir a posse de Lula. Há vários tipos de pessoas nesses acampamentos: fanáticos religiosos, agricultores, empresários rurais, caminhoneiros e terroristas. Tudo indica que o planejamento do atentado fosse do conhecimento de outras pessoas acampadas em Brasília.
Esperava-se, portanto, que os órgãos de segurança, especialmente as agências de inteligência estivessem monitorando essa turma. É praxe. Situações muito menos arriscadas, envolvendo movimentos sociais, estudantes e sindicados são monitoradas com a justificativa da necessidade de aumento da previsibilidade das ações.
No início, as autoridades alegaram que o movimento dos acampados era pacífico e, portanto, não haveria risco à ordem pública. Desde 12 de dezembro, data da diplomação de Lula e Alckmin, essa versão desmoronou. Um grupo promoveu quebradeiras e incendiou ônibus nas proximidades do hotel onde estava hospedado o presidente eleito. Na ocasião, foi preso apenas um líder indígena. Numa decisão estranha, a Polícia Militar optou por não prender nenhum outro manifestante.
Desde então, nada justifica a inação das autoridades públicas, especialmente das autoridades federais. Caberia ao ministro da Justiça, Anderson Torres, determinar à Polícia Federal investigar e monitorar o acampamento. Da mesma forma, era obrigação funcional do chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Heleno, determinar à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) que levantasse os riscos e as conexões das pessoas acampadas. O ministro da Defesa, general Paulo Sérgio, também deveria ter determinado que o Exército monitorasse essa turma, afinal de contas o acampamento está localizado a cerca de 500 metros da sede do Centro de Inteligência do Exército.
Nada disso foi feito. O aparato de inteligência do Estado se mostrou inútil. Em vez de boletins de inteligência, mapas de vínculos e relatórios de campo, fomos salvos pela diligência e zelo do motorista do caminhão-tanque. O ministro da Justiça se limitou a escrever uma nota nas redes sociais. O chefe do GSI e o ministro da Defesa continuam calados. Entretanto, vale destacar que até 31 de dezembro, é obrigação dessas autoridades zelar pela segurança dos cidadãos e pela defesa das instituições.
Atentados com bombas pareciam fazer do nosso passado político. Desde 1981, o país não assistia a ações de terroristas, visando desestabilizar a ordem política. Naquela ocasião, dois militares do Exército tentaram explodir a estação de energia de um centro de convenções no Rio de Janeiro durante um show de música. O objetivo era tumultuar a transição política e impedir a troca de governo. O atentado deu errado. A bomba explodiu antes da hora, matando um sargento e ferindo gravemente um capitão. Antes disso, havia acontecido atentados com bombas contra a sede da OAB e algumas bancas de jornais. Era o modus operandi da direita explosiva. Passados 40 anos, ela parece estar de volta. A partir de janeiro, caberá ao novo governo investigar e prender esses novos grupos terroristas.
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