DANIELA COSTA - Gerente de Clima e Justiça no Greenpeace Brasil
RODRIGO JESUS - Campaigner de Clima e Justiça no Greenpeace Brasil
No Brasil, os impactos históricos das fortes chuvas nas cidades são cíclicos, racistas, desiguais e estruturais. São diversas as situações que experienciamos em nosso cotidiano quando nos deparamos com o momento de fortes chuvas: ruas alagadas atrapalhando o trânsito e a passagem livre de pessoas; enchentes que adentram as casas e comércios, exposição com a água contaminada, deslizamentos de terra e que causam mortes e soterramentos, entre muitos outros exemplos.
Trata-se de exemplos de situações vivenciadas por muitas pessoas, mas principalmente por uma parte da sociedade que, historicamente, é a mais afetada pela degradação do meio ambiente: mulheres, pessoas negras, periféricas, comunidades tradicionais e povos originários, que vivem em áreas de risco e situação de vulnerabilidade nas áreas urbanas. Esses desastres possuem componentes sociais, políticos e econômicos e são resultado de um país com um histórico de colonização que deixou resquícios por meio do racismo ambiental e das desigualdades sociais.
Os eventos extremos, como as fortes chuvas citadas anteriormente, são fenômenos naturais que estão sendo agravados pela crise climática e a falta de políticas públicas de prevenção e planejamento urbano, colaboram para o aumento progressivo de danos humanos ou materiais com prejuízos aos cofres públicos. E quais foram as ações e as medidas para frear os impactos da crise climática que o Estado brasileiro realizou para as 8,2 milhões de pessoas que vivem nas mais de 27.660 áreas de riscos mapeadas? Infelizmente, a resposta não é muito positiva. A União segue com a deficiência de planejar ações para somar esforços para prevenção e adaptação em geral. De acordo com o levantamento da Associação Contas Abertas, o investimento do governo federal nesse segmento tem sofrido retrocessos.
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O ano de 2013 registrou o maior orçamento para gestão de desastres identificado até o momento, o equivalente a R$ 3,5 bilhões. Esse valor, porém, vem sendo reduzido ao longo dos anos: em 2022, por exemplo, foram destinados R$ 2,8 milhões e a expectativa até o momento para 2023 não é melhor. A proposta da Lei Orçamentária (PLOA) de 2023 apresenta um orçamento pífio na prevenção de desastres: R$ 25 mil reais. Essa redução de mais de 90% representa um total retrocesso em relação aos principais projetos e obras de contenção de encostas nas áreas urbanas, no sistema de drenagem e no manejo de águas pluviais. Os investimentos do Fundo Clima, que também apoia medidas de adaptação, caíram drasticamente nos últimos anos, saindo de R$ 219 milhões em 2011 para R$ 525 mil em 2022.
Quantas Petrópolis, Teresópolis, Recifes e Itabunas precisam ser severamente impactadas para que a prevenção e adaptação seja prioridade na agenda política deste país? Segundo levantamento da Confederação Nacional de Municípios (CNM), o Brasil já registra cerca de 345 milhões de pessoas afetadas com as chuvas entre 2013 e 2022, e o prejuízo aos cofres públicos já ultrapassou o montante de R$ 341,3 bilhões. Foram aproximadamente 4.816 ocorrências registradas de impacto das fortes chuvas nestes últimos anos e mais de 5,2 milhões de unidades habitacionais com danos materiais no mesmo período.
O governo Bolsonaro deixou sua marca registrada de abandono às populações em situação de vulnerabilidade. E esses números só tendem a aumentar diante da inação do Estado na formulação de uma estratégia de mitigação e investimento em adaptação. Isso precisa mudar. São vidas que estão constantemente nessa situação de abandono e racismo ambiental. Para reconstruir o Brasil, serão necessários recursos, planos e ações com participação social para adaptação climática a fim de garantir resiliência e evitar que outras tragédias aconteçam.
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