REJANE JUNGBLUTH SUXBERGER — Juíza do TJDFT
No último dia 23, a Embaixada da Suécia — em parceria com o STJ — abriu a exposição Her rights! Money, power, autonomy. A mostra trata da evolução histórica das conquistas femininas, especialmente da independência econômica. No dia 25, a Embaixada promoveu uma mesa de debates com o mesmo tema. A data foi escolhida em razão do Dia Internacional da Eliminação da Violência contra a Mulher. A referência rememora o 25 de novembro de 1960, quando as irmãs Tereza, Mirabal-Patrícia e Minerva foram presas, torturadas e brutalmente assassinadas, evento que ficou conhecido como o sacrifício de Las Mariposas.
A data e o evento são importantes para destacar como a participação das mulheres na vida pública ainda é marcada por variação salarial, intimidação física, desqualificação intelectual e assédio sexual. Ingressar num campo definido para e pelos homens significa lutar contra um sistema criado para ser "naturalmente masculino".
O preconceito de gênero no ambiente laboral dificilmente é explícito. Ele se faz presente nas coisas que não vemos: nos convites para eventos que deixamos de receber; quando uma profissional é deixada de lado para se dar destaque a um profissional do sexo masculino; nas faltas de indicações a lugares de evidência nas administrações das empresas. Enfim, no esquecimento. Ser homem é não ter gênero. Ser mulher, não importa que atividade se exerça, é primeiramente e acima de tudo ser vista como mulher.
Esse silêncio em torno da invisibilidade feminina nos espaços culmina na baixa representatividade de mulheres em espaços de decisão. Esse problema se retroalimenta: quanto menos mulheres houver em posições de destaque, menos receptiva será a sociedade conosco.
A baixa representatividade das mulheres em posições de destaque vem geralmente acompanhada das justificativas padrões de que "eventuais tentativas de convidar mulheres fracassaram". Esse é o tipo de fala que revela a falta de boa vontade em alcançar a paridade de gênero dentro do ambiente de trabalho. A falta de compreensão de que a divisão desigual do trabalho doméstico ainda pesa sobre os nossos ombros e que isso enseja uma prática discriminatória e repetida se traduz em silêncio conivente na manutenção das desigualdades.
Significa ocultar o fato de que, enquanto as decisões da vida privada pouco ou quase nada interferem na vida pública de homens, existe necessariamente uma escolha a ser feita por nós, mulheres. Vida pública e privada estão intrinsecamente ligadas em nossa sociedade quando se é mulher.
A dominação masculina é disfarçada como "uma parte da vida". Não é percebida como uma construção imposta unilateralmente para o benefício do grupo dominante, ou seja, dos homens. É preciso que compreendamos o que realmente produz e mantém as estruturas de desigualdade e opressão. É preciso compreender e retirar dessa invisibilidade, como os sistemas discriminatórios criam e perpetuam as desigualdades que estruturam as possibilidades relativas das mulheres nos ambientes de trabalho.
A inclusão da perspectiva de gênero em todos os processos de reconstrução é indispensável para a criação de uma sociedade sustentável. Compreender que mulheres apresentam demandas distintas das masculinas não é apenas uma vertente de reivindicação, mas um reconhecimento da desigualdade existente entre os gêneros. Somente esse reconhecimento tornará possível traçar intervenções que realmente priorizem a mulher.
Outro modelo de sociedade é possível desde que mulheres e homens estejam em condições de igualdade no trabalho remunerado e nos trabalhos de cuidado. Estado e sociedade precisam assumir uma responsabilidade social e compartilhada, em que se reconheça aos homens a corresponsabilidade dos cuidados. Faz-se imprescindível uma mudança estrutural que conduza a políticas orientadas a diluir a divisão sexual do trabalho por meio de maior inclusão dos homens no cuidado.
Essa transformação significa considerar que os cuidados são de responsabilidade de todos: família e Estado. Trata-se da conscientização de uma responsabilidade social, coletiva, comum e pública. Essa consciência é localizada em outra lógica de vida, nas questões relativas à subsistência, à solidariedade, ao altruísmo, à reciprocidade, aos afetos e à sustentabilidade que estão vinculados como o bem comum e o bem-estar global.
É preciso desmantelar a desvalorização de tudo o que tem a ver com a reprodução social e as assimetrias construídas em torno da divisão sexual do trabalho. Impõe-se considerar que tanto os processos de produção como os de reprodução social são indissociáveis e é precisamente sua interação que gera valor social e, portanto, também riqueza.
Infelizmente, nossos ventos não têm sido muito favoráveis à igualdade de gênero. E não é porque no caminho esses direitos foram mitigados. Na verdade, nunca sopraram nessa direção. Despratriarcalizar a sociedade, valorizar a potencialidade gênero-transformativa das ações e políticas públicas, considerar a previsão de impacto sobre a transformação da norma social de gênero construída através da divisão sexual do trabalho. São providências mínimas a assegurar uma igualdade material entre mulheres e homens.
Qualquer proposta de ação política que acompanhe uma narrativa de emancipação ou transformação social deveria considerar a implicação dos homens no cuidado da vida e a contribuição por meio da diluição e do enfrentamento à divisão sexual do trabalho.
Desmontar o sistema de privilégios das masculinidades patriarcais é avançar na desnaturalização da hegemonia cultural, transformando a sensibilidade social num processo de reorganização social de tudo aquilo que intervém nos processos de emancipação das mulheres. Ainda é preciso se perguntar: realmente estamos em condições de imaginar uma organização socioeconômica além da ordem de gênero?
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