Opinião

Artigo: Que 2023 seja de mudanças

Fico na torcida para que sejam recuperados os legados dos que se dedicaram à causa indígena, tantos que compreenderam, valorizaram e se dedicaram à defesa da dos povos originários

Rosane Garcia
postado em 05/12/2022 06:00 / atualizado em 05/12/2022 11:49
 (crédito: Reprodução/INSTAGRAM/PSOL)
(crédito: Reprodução/INSTAGRAM/PSOL)

Em vários momentos, até sonhamos. Era inimaginável supor que os povos indígenas alcançassem um espaço de poder. Mas eles chegaram e, agora, formam a Bancada do Cocar na Câmara, com Sonia Guajajara, Juliana Cardoso, Célia Xakriabá, Silva Waiãpi e Paulo Guedes — lamentável a não reeleição de Joenia Wapichana. Essa conquista, ao lado do prometido Ministério dos Povos Originários, tem enorme significado e pode ser mais um passo importante para — quem sabe? — interromper conflitos, invasões, mortes precoces, assassinatos premeditados, desmatamento, ações de garimpeiros ilegais, transmissão de doenças e tantas outras mazelas.

Fico na torcida para que sejam recuperados os legados dos que se dedicaram à causa indígena, como os irmãos Villa Lobos, os sertanistas Sidney Possuelo, Apoena Meirelles, Ezechias Heringer, José Porfírio de Carvalho, Bruno Pereira, os antropólogos Cláudio Romero, Isa Maria Pacheco Rogedo e tantos outros que compreenderam, valorizaram e se dedicaram à defesa dos povos originários.

Na faculdade, a minha primeira entrevista — dever de casa do laboratório de jornalismo — foi com Marcos Terena, o primeiro piloto indígena de aeronave. Não esqueci a conversa com Terena. Para ele, os indígenas precisavam sair das aldeias, sem romper com seu povo, e compreender os "códigos" dos brancos, para saber se defender.

Ao longo dos anos, assistimos a inomináveis episódios de crueldade com os indígenas. Perdeu-se a conta de quantos foram assassinados, tiveram aldeias incendiadas, mulheres e adolescentes violentadas, infectados por doenças que não os livraram de sucumbir pela falta de assistência médica adequada. Repetindo a história, foram, como sempre, atacados de todas as formas pela ambição desmedida de brancos que queriam, e ainda desejam, ocupar os territórios dos diferentes povos. Episódios revoltantes em um país com as dimensões do Brasil, onde há espaço para todos conviverem em harmonia, respeitando aqueles que aqui estavam antes da colonização.

No primeiro ano da Assembleia Constituinte (1987/1988), testemunhei o emocionante e brilhante discurso de Ailton Krenak, em defesa dos povos indígenas. Do púlpito da Câmara dos Deputados, enquanto pintava o rosto de preto — líquido extraído do jenipapo —, ele destacou que as comunidades originárias têm um jeito próprio de pensar e viver, que não colocam em risco a vida dos animais e muito menos dos humanos. No entanto, ainda que inofensivas, inclusive ao patrimônio dos brancos, as diferentes etnias eram alvo de agressões por uma sociedade que não sabe respeitar os mais fracos — como ainda ocorre. A Constituição de 1988 avançou em relação aos povos originários. Mas os sucessivos governos não levaram a sério determinações da Carta Magna. Espera-se que 2023 seja o marco de mudanças.

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