NOVO GOVERNO

Análise: Bolsonaro desistiu de governar? Se sim, Lula está on

A 44 dias da troca efetiva de comando no país, estamos diante de uma situação inédita desde a redemocratização. O dono da caneta desapareceu, está enfurnado dentro do Palácio da Alvorada por causa de um processo infeccioso em uma das pernas, enquanto o presidente eleito, fora do Brasil, recebe todos as atenções da mídia, principalmente a internacional

É no mínimo curioso o momento em que vivemos no Brasil. A 44 dias da troca efetiva de comando no país, estamos diante de uma situação inédita desde a redemocratização. O dono da caneta desapareceu, está no Palácio da Alvorada por causa de um processo infeccioso em uma das pernas, enquanto o presidente eleito, fora do Brasil, recebe todos as atenções da mídia, principalmente a internacional.

Acompanhei de perto as transições entre FHC-Lula (2002) e Temer-Bolsonaro (2018), as duas em que o sucessor era de um partido político diferente do antecessor. Em nada se assemelham aos dias atuais. Apesar de os holofotes se voltarem sempre para quem vai assumir a partir de 1º de janeiro, em momento algum, os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer deixaram de despachar, de atuar diretamente para que a passagem de bastão ocorresse da forma mais natural possível. Temer, por exemplo, chegou a convidar Jair Bolsonaro para participar da cúpula do G20, realizada naquele ano na Argentina.

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Agora, no entanto, tudo está diferente. Bolsonaro desistiu de participar do encontro do G20, em Bali, na Indonésia, e muito menos deu atenção à cúpula do clima, a COP27, no Egito. Já o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, teve sua participação acompanhada com atenção pela comunidade internacional, à espera de uma guinada nas políticas de proteção da Amazônia após quatro anos de enfraquecimento na gestão Bolsonaro. Antes de retornar ao Brasil, o petista cumprirá agenda hoje em Portugal, com encontro com movimentos sociais, também sob olhares da imprensa estrangeira.

E o que esperar das próximas seis semanas? Acredito que o início da Copa do Mundo, daqui a dois dias, dará uma arrefecida no clima de polarização existente no país — algo semelhante a 2014, quando bastou a bola começar a rolar nos gramados brasileiros para o "não vai ter Copa" dar lugar "ao rumo ao hexa". Avalio, inclusive, que as manifestações com viés golpistas em algumas capitais perderão força assim que começar a caminhada do time de Tite nos campos cataris. Somos o país do futebol, acima de tudo.

A transição de governo, por sua vez, continuará a todo vapor. É o que importa. A definição do primeiro escalão do governo Lula, com a escolha de ministros e indicações partidárias, se aproxima. Vai movimentar a Esplanada e sacudir o mercado financeiro, que anda atônito com as declarações do presidente eleito e com as negociações em andamento sobre a PEC no Congresso. Tudo dentro do esperado. É o que deve sempre ocorrer em uma democracia.