"Agora eu sou a Morte, a destruidora de mundos." O físico norte-americano Julius Robert Oppenheimer recorreu a essa passagem do Baghavad Gita, o livro sagrado do hinduísmo, para traduzir o que tinha acabado de fazer, em 16 de julho de 1945. Exatamente três semanas depois, o bombardeiro B-29 Enola Gay lançou a bomba atômica sobre Hiroshima, matando cerca de 200 mil pessoas. Conversei com um dos tripulantes do mensageiro da morte em 2005, numa reportagem especial sobre os 60 anos da explosão nuclear. Theodore "Dutch" Van Kirk afirmou ao Correio: "Se tivéssemos as mesmas condições com que trabalhamos naquele dia, com certeza eu faria tudo de novo". Garantiu que não se arrependia. E arrematou: "Não foi um sacrifício de vidas; os japoneses que viviam em Hiroshima e Nagasaki deram suas vidas, assim como os soldados alemães". Depois de Hiroshima, a bomba foi usada uma única vez, em Nagasaki, 72 horas depois e quase com mesmo potencial destrutivo.
Quase oito décadas se passaram, o mundo travou uma corrida em busca de armamentos capazes de fazerem cumprir a profecia citada por Oppenheimer, e a ameaça nuclear assombra o planeta. Além dos EUA, a China, a Rússia, Paquistão, Índia, França, Israel, Reino Unido e Coreia do Norte mantêm estoque de 13 mil ogivas atômicas. As atenções agora se voltam para a Ucrânia, o Irã e a Coreia do Norte. Por mais de uma vez, autoridades da Rússia admitiram que poderiam usar uma arma nuclear tática para reverter o curso da guerra, ante perdas territoriais expressivas no front. Uma ogiva atômica espalharia radioatividade e ameaçaria tanto a população ucraniana quanto a russa.
Enquanto escrevo esse texto, deparo-me com uma notícia de que o regime iranianio começou a produzir urânio enriquecido a 60% na central nuclear de Fordo. A fabricação da bomba atômica exige enriquecimento a 90%. Teerã está no caminho de se tornar mais um destruidor de mundos. A tirania norte-coreana de Kim Jong-un planeja novo teste nuclear para amedrontar a vizinha Coreia do Sul, com quem vive tensão permanente, 70 anos depois de uma guerra que deixou 3 milhões de mortos.
É inacreditável que a humanidade não tenha aprendido com os horrores de Hiroshima e de Nagasaki. É inadmissível que negligencie os horrores da explosão nuclear e do vazamento de radioatividade. Nasci em Goiânia. Tinha 11 anos quando a cápsula de césio-137 foi aberta, mas me recordo de semanas e meses de pesadelo. Das notícias sobre as mortes, da interminável fila de gente submetida à detecção de partículas radioativas no Estádio Olímpico, de parte da região central da cidade mutilada e tomada por homens da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) mais parecidos com astronautas. O mundo precisa impedir que pesadelos assim voltem a ocorrer, ainda mais quando provocados pela sanha armamentista.
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