No calor da disputa pela Presidência da República e às vésperas de o novo chefe do Executivo nacional definido pelas urnas, vazam informações sobre medidas econômicas que estariam em estudo no Ministério da Economia. Para as que provocam maior impacto sobre a população, o ministro Paulo Guedes e o governo se apressam em negar, mas é de se esperar que efetivamente os técnicos que lidam diariamente com os números das contas públicas tenham que mostrar possíveis soluções para se equacionar o rombo fiscal que espera o país em 2023. Nas contas do governo, o deficit fiscal previsto no projeto de Orçamento da União para 2023 é de R$ 63,7 bilhões, mas estimativas preveem algo próximo a R$ 100 bilhões e, nos cálculos do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), o rombo total pode chegar a R$ 430 bilhões.
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A partir desses números, os técnicos do Ministério da Economia fazem contas. E os números estão mais próximos das projeções não oficiais, uma vez que o Orçamento de 2023 prevê o valor do Auxílio Brasil em R$ 405. Os dois candidatos, Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), prometem manter o valor do benefício em R$ 600, o que, segundo o Instituto Fiscal Independente (IFI), ligado ao Senado, deve custar aos cofres públicos R$ 51,8 bilhões. Há ainda o custo da compensação aos estados pela limitação do ICMS sobre combustíveis, energia, comunicações e transporte, que os governadores estimam em R$ 83 bilhões. Déficit fiscal maior pressiona a taxa de juros, que permanece elevada por mais tempo, encarecendo o crédito e sufocando a economia.
É com esse cenário que os técnicos trabalham por obrigação, porque é deles a responsabilidade de apontar soluções, mesmo que o titular da pasta e o governo se apressem em negar. Entre as propostas em estudo estaria a eliminação das despesas com educação e saúde das deduções do Imposto de Renda da Pessoa Física — que aliviam o peso dos impostos, sobretudo para trabalhadores de renda mais alta. A medida prevê que esse corte gere uma arrecadação adicional da ordem de R$ 30 bilhões, mas, por outro lado, eleva a carga tributária sobre a renda do trabalho. E essa medida, do ponto de vista fiscal, pode nem mesmo surtir o efeito esperado, uma vez que novamente os dois candidatos prometem elevar a faixa de isenção do IR da Pessoa Física para R$ 5 mil, o que implica na redução de milhões de contribuintes na base da Receita Federal.
Outra proposta em estudo prevê a desindexação do salário mínimo e dos benefícios pagos pela Previdência Social, que Paulo Guedes nega agora, mas que é um desejo antigo do ministro da Economia. O argumento de que a desindexação não implicará redução dos salários, adotado pelo governo, esvazia o argumento da necessidade da medida. Se o reajuste não ficar abaixo da inflação é só manter as regras constitucionais vigentes hoje que determinam a recomposição do valor de compra do salário mínimo, assim como dos vencimentos dos aposentados. A proposta, obviamente, tem impacto, sobretudo nas contas da Previdência, onde 70% dos beneficiários recebem o mínimo.
O déficit fiscal para 2023 é um problema enorme para a economia brasileira a ponto de os próprios economistas do mercado financeiro falarem em um regime de exceção na regra do teto de gastos no ano que vem. Mais uma vez os dois candidatos estão próximos e defendem mudanças ou mesmo a eliminação da regra que limita as despesas. Não resta dúvida de que a situação fiscal do Brasil, um problema crônico da nossa economia, precisa ser ajustada, mas não é possível imaginar que o custo do descontrole das contas públicas recaia sobre a classe média ou os assalariados, lembrando que, sem correção, o salário mínimo hoje seria próximo a R$ 700, ou pouco mais do valor do Auxílio Brasil. Essa conta cara não pode ser jogada no colo da população.