Souza Prudente - Desembargador federal do TRF-1ª Região e do TRE-DF. Diretor da Escola Superior da Magistratura Federal da 1ª Região — ESMAF.
A Constituição da República Federativa do Brasil estabelece que o voto é obrigatório para os maiores de dezoito anos e facultativo para os analfabetos, os maiores de 70 anos e os maiores de 16 anos e menores de 18 anos (artigo 14, §1?, incisos I e II, alíneas a, b e c). O mesmo texto magno também determina que "é vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:
I — cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado;
II — incapacidade civil absoluta; III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;
IV — recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII;
V — improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4? (art. 15, caput e respectivos incisos I a V).
A Carta Magna também nos conclama a construir uma sociedade solidária, justa e livre, repudiando todo tipo de discriminação para um desenvolvimento sustentável, visando o bem-estar de todos, como fundamento da República Federativa do Brasil (CF, artigo 3?, incisos I, II e IV).
A cidadania ativa e passiva, de que nos falava Pimenta Bueno, no século XIX, e que fora apregoada na Declaração dos Direitos do Homem, da Organização das Nações Unidas, em 1948, com a determinação de que "todo homem tem o direito de tomar parte no governo de seu país, diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos" (art. 21), já adquiriu nova dimensão, no terceiro milênio.
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Com razão, pois, Carmem Lúcia Antunes Rocha, quando diz "que hoje a cidadania não se afirma apenas em uma cidade, quer dizer, o cidadão não é mais considerado em tal condição pela sua tão-só condição de membro de uma determinada sociedade política.
Os direitos — especialmente os direitos fundamentais individuais, sociais e os denominados direitos difusos — ultrapassaram as fronteiras territoriais do Estado. (...) Rompem-se as barreiras, inclusive materiais, que o Estado burguês cuidou de construir no início da era moderna. A soberania ainda é, em grande parte, do poder de um povo de um Estado.
Mas a cidadania é maior que o Estado; os direitos do povo interessam a todos os povos de todos os Estados. Os direitos fundamentais têm a fraternidade despida da farda normativa que o Estado Moderno cuidara de esculpir. Trouxeram-na ao experimento diário de cada cidadão, a se obrigar pelo seu semelhante em outro ponto do Planeta, a revoltar-se contra os maus governos de todos os Estados que os tenham assim, a rebelar-se contra todas as formas de corrupção que lesem os homens."
Neste nosso país continental e em diversos países deste planeta, milhares de pessoas que estejam hospitalizadas no pleno uso de suas faculdades mentais (com exceção daquelas que estão em coma, incomunicáveis) e que se acham plenamente habilitadas ao exercício do voto obrigatório ou facultativo, mediante atestado dos médicos que os assistem nessas inúmeras unidades hospitalares no Brasil e no Exterior, para uma eleição plena neste segundo turno para Presidente da República e alguns Governadores nos Estados da Federação Brasileira.
Não se deve olvidar que a dignidade da pessoa humana e a cidadania são pilares fundamentais da República Federativa do Brasil e nosso Estado Democrático de Direito (CF, artigo 1?, incisos I e II) e que as milhares de pessoas que seguem hospitalizadas, em 30 de outubro deste ano de 2022 e que são absolutamente capazes, no pleno gozo de seus direitos civis e políticos e que não se enquadrem em nenhuma das hipóteses de perda ou suspensão desses direitos políticos, nos termos da Carta Política Federal, podem e devem exercer seu direito de votar, mediante autorização médica, devendo as Cortes Eleitorais adotarem as medidas necessárias para a colheita desses votos no Brasil e no Exterior, onde exista algum brasileiro ou brasileira, nas condições aqui expostas, preservando a segurança e o sigilo das urnas sempre.
Conforme noticia a mídia nacional, essa experiência já se realizou, com sucesso, no Estado do Paraná e será novamente realizada no segundo turno das eleições gerais do Brasil, neste ano de 2022. Há de ver-se que tal procedimento se impõe por determinação expressa do comando constitucional acima exposto, dispensando-se qualquer Resolução nesse sentido pelo egrégio Tribunal Superior Eleitoral, bem assim pelas Cortes Regionais Eleitorais do Brasil.
Garantir o direito-dever ao voto, nesse contexto excepcional, é um dever constitucional de todos que se empenham pela afirmação do Estado Democrático de Direito no Brasil.Nos termos da Constituição da República Federativa do Brasil, o direito-dever ao voto manifesta-se como um ato público de soberania popular no cenário democrático do Estado de Direito.