O Orçamento da União é uma peça importantíssima no regime democrático. Todos os anos, o governo faz as contas, prevê quanto terá de receitas e reparte os recursos entre as áreas de acordo com o que considera prioritário, cabendo ao Congresso a responsabilidade de aprovar ou não o que foi proposto, inclusive com poder de remanejar verbas. Infelizmente, todo esse ritual não leva em conta, na maior parte das vezes, as necessidades reais da população. Atende mais aos interesses paroquiais de deputados e senadores e às pretensões políticas do governo de plantão.
As distorções na peça orçamentária do país sempre foram visíveis — e muito criticadas. Não por acaso, especialistas de todas as tendências definem o Orçamento da União como peça de ficção. Neste momento, entretanto, há um monstro arreganhando os dentes para a sociedade e sugando dinheiro importantíssimo para a população, sobretudo para as parcelas mais pobres: o Orçamento secreto. São quase R$ 20 bilhões por ano que vêm sendo usados de forma pouco transparente. Não há obrigatoriedade de prestação de contas desses recursos.
Para garantir verbas para as chamadas emendas de relator, o governo está sendo obrigado a cortar verbas de todas as áreas, mesmo as prioritárias, como as de saúde e educação. Programas fundamentais correm o risco de parar, entre os quais, o de tratamento e prevenção da Aids, e universidades federais podem suspender projetos essenciais. Não é para isso que os eleitores entregam o poder de decisão ao Legislativo e ao Executivo por meio do voto. Os cidadãos não podem ser colocados em segundo plano porque grupos de políticos decidiram se apoderar do que é de todos.
Esse avanço sobre os cofres públicos num país tão carente como o Brasil é preocupante. Esse tipo de remanejamento de verbas pode condenar o país ao atraso. Não como preterir abastecimento de medicamentos em hospitai ou deixar de garantir merenda escolar aos estudantes para atender interesses paroquiais.
Da forma como as coisas estão estruturadas agora, o Orçamento secreto subverteu a ordem do bom senso. Tirou dos cidadãos o papel de peças centrais dos gastos públicos e colocou certos interesses de um grupo de políticos como prioridade. No último 2 de outubro, as urnas eletrônicas definiram o Congresso que dará as cartas nos próximos quatro anos. Mesmo com uma importante renovação entre deputados e senadores, nada indica que a população voltará a ser prioridade no Orçamento da União. Ou seja, é preciso acompanhar esses movimentos com atenção para evitar retrocessos.
O Orçamento de 2023 ainda está dependendo de discussão no Congresso. Por causa das eleições, tudo parou. Não há mais espaço para defesa de políticas que reforçam a desigualdade e são dominadas por castas, em que poucos sugam os recursos públicos e, consequentemente, com as portas escancaradas para a corrupção. Certamente, não é a nação que se deve entregar para as próximas gerações.