EDITORIAL

Visão do Correio: A economia e a percepção de melhora

A recuperação da economia neste momento é inegável, com a atividade crescendo acima do esperado, os preços em deflação e o desemprego em queda. O Produto Interno Bruto (PIB) aumentou 1,2% no segundo trimestre e as projeções apontam para uma expansão entre 2,5% e 3%. Com a limitação dos impostos estaduais sobre os combustíveis e energia, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial, teve deflação de 0,68% em julho e de 0,36% em agosto, caminhando para registrar novo recuo de preços em setembro, como apontou na semana passada o IPCA-15 — prévia do indicador oficial — com queda de 0,37% nos preços. Já o desemprego caiu para 8,9% no trimestre encerrado em agosto, no menor percentual desde o trimestre encerrado em julho de 2015 e, depois de dois anos, o salário médio do trabalhador brasileiro avançou 3,1%.

Vendo assim, há motivos para comemorar e apontar que o Brasil vai muito bem. O que não necessariamente é garantia de sustentabilidade e, seguramente, ainda de forma a não ser percebida por uma grande parcela da população. O crescimento econômico alimenta as estatísticas e é a base para a melhoria da renda e do emprego, esses sim, indicadores percebidos pela população, sobretudo a menos favorecida. A retomada permite reduzir o índice de desemprego, mas é insuficiente para a percepção da sociedade, isso porque ainda existem 9,7 milhões de pessoas sem trabalho e outros quase 40 milhões na informalidade e sem direitos trabalhistas como férias, 13º e seguro-desemprego.

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É para esse contingente que a melhora da economia passa despercebida. Até mesmo quando se trata da renda. O salário médio do trabalhador voltou a crescer depois de oscilações e estabilidade. No trimestre encerrado em agosto, ele foi de R$ 2.713, com avanço de 3,1% em relação ao trimestre anterior. Mas praticamente igual ao do trimestre finalizado em agosto do ano passado e ainda longe dos R$ 3 mil pagos nesse mês em 2015. Há outros indicadores que mostram a fragilidade da recuperação do mercado de trabalho, como o fato de o contingente de empregados sem carteira assinada no setor privado ter chegado a 13,2 milhões de pessoas, o maior da série histórica, iniciada em 2012. Outros 4,37 milhões eram empregados domésticos, também sem carteira, enquanto os que trabalham por conta própria somam 25,9 milhões, entre eles motoristas de aplicativo, entregadores e ambulantes.

Esse contingente elevado de trabalhadores em condições precárias convive com o agravante de ter a renda deteriorada pela inflação, que, embora esteja em queda, ainda acumula alta de 8,7% em 12 meses e de 4,39% no ano, com um detalhe: a redução ocorrida nos últimos meses está fortemente concentrada nos preços dos combustíveis e do transporte. Excluindo esses itens, a deflação quase desaparece ou vira inflação. O grupo de alimentos, que em setembro teve a primeira queda, segundo o IPCA-15, acumula aumento de 12,73% em 12 meses e de 10,37% no ano. Trabalho informal, renda diminuída e alimentos caros são o que impedem parte da população brasileira de perceber melhora na qualidade de vida, objetivo maior da dinâmica econômica.

Os números mostram que muito embora a economia esteja melhorando, esse avanço não é suficiente nem sequer para garantir que no ano que vem tenhamos expansão maior da atividade econômica. O mercado projeta aumento de 0,53% do PIB no primeiro ano do próximo governo, seja ele qual for. Certo é que o próximo presidente terá que tomar medidas para garantir não apenas um auxílio de R$ 600 para cerca de 22 milhões de famílias a um custo de R$ 51,8 bilhões, mas condições de criação de emprego e renda para que o trabalho volte a gerar renda e alavancar o consumo. Além disso, terá de adotar medidas para evitar que os preços voltem a acelerar e para minimizar os impactos de uma recessão nos Estados Unidos, segundo mercado para as exportações brasileiras. As campanhas de segundo turno dos candidatos à Presidência da República focam em embates mais ideológicos do que programáticos, mas o desafio econômico do vencedor será grande.