JOSÉ HORTA MANZANO - Empresário e blogueiro
O último páreo ocorreu ontem. Depois de quatro intermináveis semanas. Com a respiração suspensa, o Brasil palpitou à espera do resultado. Não foram muitos pontos de porcentagem a separar o vencedor do derrotado. Oito anos atrás, escrevi, neste mesmo espaço, carta aberta à presidente Dilma Rousseff, que acabava de ser reeleita. Desta vez, escrevo minha cartinha ao novo presidente.
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Senhor Presidente,
Antes de mais nada, deixo aqui minhas felicitações pela vitória. A meu juízo, foi o pleito mais emocionante desde a eleição de Tancredo Neves — que foi indireta, mas carregada de suspense e simbolismo.
Meus parabéns vão a vosmecê, mas também ao perdedor. O fato de terem chegado à final embalados por dezenas de milhões de votos há de ser lisonjeiro para ambos. Quando se pensa que, quatro anos atrás, um dos finalistas de hoje era um apagado parlamentar do baixo clero, enquanto o outro estava fora do jogo político por motivo de prisão, a caminhada de ambos foi excepcional.
Vosmecê, senhor presidente, vai encontrar um país partido em dois. É lugar comum dizer que é hora de unir, não de separar — só que, desta vez, o sulco é profundo. É urgente agir antes que o fosso vire um cânion intransponível. Já faz 20 anos que o sulco começou a ser cavado; os últimos quatro anos só fizeram alargá-lo. Esses rachas podem comprometer até nossa integridade territorial. Não se brinca com essas coisas.
Não é hora de procurar culpados, é hora de agir. A continuar como está, a combinação de divergências religiosas com desnível socioeconômico periga armar uma bomba-relógio desregulada que vai explodir a qualquer momento.
Não tenho certeza de que isso seja boa notícia para o governo, seja quem for o presidente. Convulsão social nem sempre segue o itinerário que se gostaria. Em geral, costuma se voltar contra o poder.
Num país de desigualdades socioeconômicas abissais como o Brasil, programas de redistribuição de renda não são meros truques eleitoreiros — são necessidade absoluta para a sobrevivência de dezenas de milhões de conterrâneos.
Senhor presidente, é indispensável dar prosseguimento a eles. O que pode (e deve) ser acrescentado é uma porta de saída, um objetivo, um incentivo, uma meta. Todo beneficiário tem de sentir que, em troca do auxílio, deve algo ao poder público.
Pouco importa o valor da contrapartida, o que interessa é incutir a ideia de troca: "Recebo, mas tenho que dar". O Brasil é grande, mas está longe de ser uma ilha autossuficiente pairando acima das querelas do mundo. Estamos inseridos na economia global, seja qual for o credo de nosso governante.
Atitudes sectárias e clivantes do tipo "ênfase nas relações Sul-Sul" ou "reforço de laços com governantes de direita" são contraproducentes. Nosso país tem de se abrir ao mundo. Seu destino é muito mais amplo do que o encruamento em que se encontra.
Como repetia o general De Gaulle, nações não têm amigos, têm interesses. O presidente do Brasil, dado o imenso poder que lhe confere a Constituição, tem de se compenetrar desse fato. Não o fazendo, nossas trocas comerciais vão se ressentir e nossa imagem no cenário internacional vai continuar desbotando.
Daqui a meio século, senhor presidente, não estaremos mais aqui, nem vosmecê, nem eu. Cidadão desimportante, me contentarei com uma lápide de pedra barata. Já vosmecê estará nos livros de história. Sua memória poderá ser exaltada ou pisoteada, dependendo de seus atos e palavras nos próximos quatro anos. Quando, no futuro, se referirem a vosmecê, será melhor que digam "aquele que fez o Brasil decolar" ou "aquele que fez o país empacar de vez"?
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