Eleições 2022

Artigo: Sobre o dia do "juízo final"

Marcos Paulo Lima
postado em 29/10/2022 06:00
 (crédito: Nelson Almeida e Evaristo Sa/AFP)
(crédito: Nelson Almeida e Evaristo Sa/AFP)

A igreja evangélica brasileira está no limite da maior vitória ou derrota de sua história. A sinergia pela eleição de Bolsonaro (PL) ou Lula (PT) não tem precedentes nos púlpitos deste país. De repente, fiéis que distribuem folhetos nas ruas no democrático exercício de evangelização para que pessoas aceitem a Jesus como seu único e suficiente salvador se viram — consciente ou inconscientemente — distribuindo santinhos on-line e/ou presencialmente pela conversão a uma das duas seitas políticas.

Lideranças evangélicas derraparam. Defenderam valores inegociáveis, mas negociaram algumas convicções em troca de interesses coletivos — e pessoais. Posar ao lado de Bolsonaro ou Lula virou troféu ostentado nas redes sociais. Houve vista grossa para questões antes inaceitáveis na sã doutrina. Ouvidos se tamparam para palavrões. Olhos se fecharam para debates seríssimos. Um deles, a misoginia.

A igreja evangélica nunca colocou tanto a mão na massa por Bolsonaro ou Lula como nesta campanha. Reuniões às quatro paredes ou ao ar livre viraram "cultícios". Templos dos mais simples aos luxuosos se transformaram em sucursais de comitês de campanha. O melhor endereço cristão para a retirada de material panfletário do lado verde-amarelo ou vermelho da força.

Imagino a reação de Jesus visitando algumas igrejas brasileiras em tempo de eleições. Na Bíblia, o capítulo 4 de João relata a revolta do Mestre com quem transformou o templo de Jerusalém em mercado. Indignado, acabou com a feira aos gritos de "não façais da casa de meu Pai um mercado". Vendedores de bois, ovelhas e pombas bateram em retirada enquanto Cristo jogava no chão o dinheiro dos cambistas e derrubava suas bancas. Talvez, líderes evangélicos ficariam constrangidos com uma fúria semelhante. Constrangidos, mas não envergonhados. Há quem sinta o ego massageado nos encontros com Bolsonaro ou Lula. Os mais oportunistas, à espera do triunfo para o toma-lá-dá-cá político na posse.

A igreja não é senhora nem pode servir ao Estado. Não controla e muito menos deve ser domada. Não deve abrir mão da consciência crítica. Ligações perigosas precisam ser questionadas, modeladas, revistas, cortadas. A melhor baliza é a independência profética. Parcialidade para apontar o certo e o errado. Diferente das paixões políticas testemunhadas neste ano. A igreja não deve se posicionar tão perto do Estado, a ponto de comprometer seu testemunho público; nem se manter distante, como um espaço alienado e alienante. No entanto, abriu-se mão do equilíbrio. O engajamento religioso deu lugar ao político.

O capitulo 3 de Timóteo na Bíblia é profético. Projeta o comportamento nos últimos dias: "Os homens serão mais amantes dos prazeres do que amigos de Deus". O prazer de Bolsonaro e Lula é o seu voto — não a sua religião, comunhão com irmãos o ou ele com o Pai. A eleição vai passar. A igreja seguirá seu caminho, mas terá de juntar cacos na alegria ou na tristeza. Escolhas dos dois lados disseminaram a discórdia entre 40 milhões de evangélicos. A igreja precisará ser curada. Bom voto amanhã. Pacífico.

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.