Eleições 2022

Artigo: Meu voto será para o Lula

"O que considero razão maior do voto em Lula, é que Bolsonaro parece desejar repetir o que fez Chávez, na Venezuela"

Carlos Mário da Silva Velloso
postado em 29/10/2022 06:00 / atualizado em 29/10/2022 11:22
 (crédito: Caio Gomez)
(crédito: Caio Gomez)

Indaga-me o Correio, se votarei amanhã no Lula e, se positiva a resposta, por que eu assim procederia. Minha resposta é positiva. Mas antes quero esclarecer que nunca votei em Lula. Não sei se sou centro-direita ou centro-esquerda, mesmo porque esquerda e direita, no nosso país, nem sempre correspondem ao que seria, na realidade, esquerda e direita.

Se ser de esquerda é ter consciência social, desejar que seja assegurada assistência aos pobres, proporcionando-lhes oportunidade para que possam crescer, ter condições, por exemplo, de ingressar na universidade pública, ter um bom serviço de saúde e de segurança pública e, se ser de direita é desejar compatibilizar igualdade, em termos materiais, com liberdade, mas sem pensar em "laisser faire", não sou, na realidade, de direita; quero sim praticada a doutrina social da Igreja, quero a democracia social em termos europeus. Noutras palavras, tenho em mira o capitalismo europeu e não o norte-americano.

Dou as razões pelas quais o meu voto será para o Lula.

A jornalista Vera Magalhães, no seu artigo da última sexta-feira, "Brasil: ontem, hoje e amanhã" ("O Globo", 28.10.2022), escreve que, nas eleições deste domingo, poderá ocorrer uma mudança de era. E que nessa mudança o que estará em jogo é a vigência plena da democracia. E que o risco "de uma vitória de Bolsonaro solapar a normalidade institucional," é que "levou forças tão distintas do espectro político, da esquerda à centro-direita, a se reunir" e declarar seu voto em Lula. Perfeita a afirmativa. Primeiro que tudo, é bom observar que a chapa é Lula para presidente e Geraldo Alckmin para vice. Ora, em Alckmin, muitos de nós já votamos. Alckmin foi prefeito, foi governador de São Paulo, o Estado que tem um sistema econômico eficiente e poderoso.

A chapa Lula-Alckmin, além da adesão de Simone Tebet, recebeu a adesão entusiasmada de Fernando Henrique e dos economistas do "plano real", dentre outros nomes notáveis, Armínio Fraga, Lara Resende, Edmar Bacha, Pérsio Arida, André Lara Resende, Pedro Malan. E Henrique Meirelles, que no primeiro mandato de Lula, consolidou a aplicação do Plano Real. E, mais à frente, ministro da Fazenda do governo Temer, pôs ordem na economia. A inflação, então de dois dígitos (10,06), foi reduzida para menos de sua meta, 4,5. Contra Lula pesa, não se pode contestar, a acusação de que no seu governo foi praticada a corrupção. Lula chegou a ser condenado.

Mas contra o governo de Bolsonaro pesa a acusação de corrupção semelhante e até maior do que aquela em que se embasou a acusação conhecida como a do "mensalão", isto é, a instituição do orçamento secreto, orçado em mais de 31 bilhões. Bolsonaro vetou a primeira iniciativa. Mas o exame do que o governo fez depois o envolve na instituição desse famigerado orçamento.

Sim, Lula foi condenado. Sua condenação, entretanto, foi anulada. E anulada pelo Supremo Tribunal Federal. Lula chegou a ser preso. Passou mais de um ano na cadeia. Lula hoje me parece outro homem. Tem se aliado a nomes respeitáveis. Não acredito, porque acredito na natureza humana, que num novo governo dificilmente poderão ocorrer fatos semelhantes aos ocorridos no seu segundo governo, em que se embasaram as acusações de corrupção.

Mas o que considero razão maior do voto em Lula, é que Bolsonaro parece desejar repetir o que fez Chávez, na Venezuela. Bolsonaro fala em "enquadrar o Judiciário", quer armar os seus seguidores, mistura religião e política, quer a exploração econômica da Amazônia, lembra Vera Magalhães. E cria ele factóides quanto ao processo eleitoral, levantando dúvida sobre o árbitro do pleito democrático, a Justiça Eleitoral, criada em 1932 e, pela primeira vez, nesses 90 anos de sua existência, vítima de aleivosias. A urna eletrônica, criada em 1995-1996, utilizada, pois, há mais de vinte e cinco anos, sem qualquer evidência ou indício sério de fraude, foi posta em dúvida por Bolsonaro. A urna eletrônica, concebida pelos brasileiros de boa vontade, e cuja criação contou com a ajuda das Forças Armadas, que nos mandou técnicos nomeados, integrantes dos serviços de informática do Exército e da Marinha e de notável professor do Instituto Tecnológico da Aeronáutica. E mais, com técnicos do Instituto de Pesquisas Aeroespaciais (Inpe), aliados aos técnicos do TSE, dos TREs, da Telebras e de outros respeitáveis órgãos públicos.

Eu votei, em 2018, no segundo turno, em Bolsonaro. Não fazia ideia do que viria depois. Não repetirei o voto equivocado. Vou votar no Lula, pensando nos nossos filhos e netos, pensando no nosso país.

Carlos Mário da Silva Velloso é ministro aposentado e ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)

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