O Brasil assistiu, atônito, no último domingo, um ex-deputado federal, que estava em prisão domiciliar, atacar agentes da Polícia Federal com 20 tiros de fuzil e duas granadas. Uma violência inaceitável, cujos desdobramentos revelaram forte conotação política, a ponto de o ministro da Justiça, Anderson Torres, que é delegado federal, ter se deslocado de Brasília para o interior do Rio de Janeiro a fim de convencer o bandido Roberto Jefferson a se entregar. Não há histórico recente na PF de uma intervenção direta do chefe da corporação para solucionar um caso que estarrece por seu conjunto e todas as suas particularidades.
A prisão de Jefferson ocorre a uma semana de os brasileiros retornarem às urnas para decidir quem será o próximo presidente da República. Um dia antes de o ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ter transformado a prisão domiciliar do ex-parlamentar em preventiva, o criminoso havia comparado a ministra Cármem Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), a "prostitutas, arrombadas e vagabundas". Ele sabia que, diante desse despautério, a reação do Judiciário viria e premeditou toda ação que deixou dois policiais feridos, foi filmada e exibida em redes sociais. Uma aberração.
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Nada do que se viu nesse caso pode ser normalizado. Jefferson, que diz representar os cidadãos de bem e se apresenta como defensor da política de que bandido bom é bandido morto, só se rendeu quando o ministro da Justiça lhe deu todas as garantias de proteção. Antes, ainda na tensão pós-disparos de fuzil, os policiais que tinham a missão de prendê-lo disseram que aceitariam todo tipo de negociação — alguns deles, rindo da situação. Pior, um integrante do PTB, partido do qual o ex-deputado foi presidente, que anda disfarçado de padre, teve acesso livre ao local do crime, cabendo a ele entregar a arma do disparo aos agentes federais, ferindo todos os protocolos da PF.
Não há como aceitar passivamente o que se passou na cidade de Levy Gasparian. Jefferson tinha 13 armas em casa, a despeito de estar em prisão domiciliar. Assim como ele, milhões de cidadãos se armaram nos últimos anos, beneficiados pela flexibilização nas regras para porte e posse de armamentos. São muitos os alertas de que parte desse grupo, que se apresenta como de caçadores, pode liderar um levante contra o resultado das urnas caso o seu candidato não seja o vencedor. O ex-deputado, agora atrás das grades, é um contumaz defensor da violência como estratégia para intimidar as instituições democráticas. Para ele e aliados, a invasão do congresso dos Estados Unidos em janeiro do ano passado foi a senha para que o mesmo se repita no Brasil.
Todos aqueles que têm apreço pela democracia devem repudiar com veemência qualquer forma de violência. O país precisa de paz para enfrentar as mazelas que envergonham a sociedade e barram o futuro das novas gerações. Está claro que, mantido o atual clima de virulência, o Brasil caminhará rapidamente para o precipício. Ainda há tempo de frearmos a barbárie e recolocarmos a nação nos eixos do crescimento econômico e da redução das desigualdades sociais. Nesse contexto, não há espaço para criminosos como Jefferson e aqueles que o apoiam. O Brasil, sabe-se, é muito maior que esse grupelho que despreza o bom convívio social e as liberdades individuais.
Em meio a tantos absurdos, é imperativo ressaltar a pergunta que muitos têm feito — e com razão: se um cidadão comum tivesse cometido os crimes de Jefferson receberia as mesmas regalias? Certamente, não. Estaria morto, sobretudo se fosse negro e pobre.
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