opinião

Artigo: Para além de gênero e etnia

Como empregadoras de um grande contingente de mão de obra, as empresas têm um papel social extremamente relevante a desempenhar nessa direção

Por Edson Paixão — Vice-presidente e gerente-geral da Ultragenyx Brasil

Diversidade. Equidade. Inclusão. Nos últimos tempos, esse trinômio tem pautado, cada vez mais, os discursos e iniciativas de segmentos variados da sociedade, dos parlamentares às empresas, e impulsionado a atuação de um grande número de organizações da sociedade civil. São narrativas e ações que nos ajudam a entender a pluralidade e as reais necessidades da nossa população, despertam nossa atenção para o caminho que estamos construindo, assim como para o que ainda nos falta realizar como agentes de um mundo mais justo e igualitário.

Como empregadoras de um grande contingente de mão de obra, as empresas têm um papel social extremamente relevante a desempenhar nessa direção. Isso sem contar que também se beneficiam de um ecossistema de trabalho diverso, rico e inclusivo, como atestam inúmeros estudos sobre o impacto positivo da diversidade no mundo corporativo.

Pesquisas como a do Global Recruiting Trenós, realizada pelo o LinkedIn em 2018, mostram que equipes diversas são mais criativas, engajadas, inovadoras e produtivas. Em outro levantamento, a consultoria McKinsey & Compans constatou que a pluralidade também torna os colaboradores mais realizados, porque se sentem à vontade para ser quem são nas empresas que valorizam este quesito.

No entanto, apesar de avanços inegáveis, como o aumento da participação feminina no mundo do trabalho, ainda estamos falando de um universo muito desigual. As mulheres ainda enfrentam desafios, uma vez que ocupam apenas 37,4% dos cargos gerenciais do país e recebem somente 77,7% do salário dos homens, conforme aponta a pesquisa "Estatísticas de gênero: indicadores sociais das mulheres no Brasil", realizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 2019.

Problemas de inclusão e equidade também podem ser constatados entre as pessoas negras, que ocupam menos de 30% dos cargos de liderança. Já os indígenas, por sua vez, são ainda mais ausentes do mercado de trabalho. Uma amostra desse cenário pode ser observada no universo das 500 maiores empresas do Brasil que juntas empregam menos de 1% de indígenas.

Pesquisa realizada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) em conjunto com a plataforma Somos Diversidade e UNAIDS Brasil revela que, mesmo entre as populações excluídas do mercado de trabalho, a representatividade dos grupos minoritários não é homogênea. Ou seja, existem entre os segregados certos segmentos que são mais marginalizados que outros — verdadeiros exércitos de pessoas invisíveis aos olhos de recrutadores e gestores.

É o caso de migrantes, refugiados, negros, pessoas com 50 anos ou mais, egressos do sistema penitenciário ou em liberdade assistida, pessoas com deficiência (P.c.) e LGBTQIAP+. Considerando-se apenas este último grupo, existem graus variados de exclusão: transexuais são os mais discriminados, conforme apurou o estudo.

Merecem ser ressaltadas também as dificuldades enfrentadas pelas pessoas com deficiência (PcD) devido ao grande número de indivíduos alijados da força de trabalho do país em decorrência de sua condição física ou mental. Segundo o IBGE, cerca de 24% dos brasileiros possuem algum tipo de deficiência, o que representa um total de 45 milhões de pessoas, além de 13 milhões que sofrem de doenças raras.

Apesar da determinação da Lei de Cotas (Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991), que obriga empresas com mais de 100 funcionários a destinar 2% a 5% das vagas para PcD, apenas 1% dos empregos formais do país são ocupados por esses profissionais. Ou seja, passados cerca de 30 anos de vigência da lei, entre os mais de 40 milhões de empregos com carteira assinada, menos de 400 mil são direcionados a esse grupo, de acordo com o levantamento.É importante lembrar que, no caso das pessoas com deficiência, a segregação vem associada a outros fatores que travam a inclusão e precisam ser combatidos, como o estigma e o preconceito. Os mais comuns são os que associam esses indivíduos à falsa ideia de incapacidade, o que, na prática, coloca em xeque suas habilidades pessoais e profissionais e as afastam do mercado de trabalho.O capacitismo, termo que define a atitude discriminatória em relação às PcD, está longe de ser um tópico popular. Porém, deveria ser amplamente discutido, dada a necessidade de trazer essa questão à luz e conscientizar a população sobre esses vieses que nada mais são que pré-julgamentos, na maioria dos casos infundados.

O que todos esses estudos sobre diversidade, equidade e inclusão nos mostram é que ainda temos um grande desafio pela frente como governo, Estado e sociedade. Por outro lado, eles nos apontam possibilidades de construção e aperfeiçoamento de caminhos para os abismos que temos a obrigação social de resolver.

Encarar essas questões de frente e procurar solucioná-las é o que nos tornará, de fato, preparados para caminhar da teoria à prática e para dar os passos necessários para que nossas legislações afirmativas saiam do papel. Somente assim, a pluralidade e a diversidade se tornarão focos permanentes nos nossos negócios, nas nossas vidas e no país.

 

Saiba Mais