ARTUR MARQUES DA SILVA FILHO - Desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e presidente da Associação dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo
No transcurso dos 200 anos da Independência, 133 da Proclamação da República e 34 da promulgação da Constituição de 1988, marcos de nossa autonomia como nação e afirmação de nossa democracia, já é tempo de avançarmos em termos de amadurecimento político. Polarização extremada, truculência verbal, intolerância e fake news, como se observa de modo crescente há algum tempo, provocam tensões sociais e pressionam as instituições.
A cada eleição, como a que se aproxima, não podemos ter a desconfortável sensação de ruptura. Partidos, ocupantes de cargos eletivos e candidatos, assim como seus adeptos e eleitores, não podem portar-se como se fossem inimigos. A rigor, são adversários, na legítima disputa pelo poder e de cujo debate devem brotar e se desenvolver ideias capazes de solucionar os problemas nacionais.
Infelizmente, desvirtua-se no país a relação entre os partidos, os poderes da República, as autoridades e as pessoas de diferentes ideologias. Há excessivo patrulhamento, tom de ameaças, acusações e bravatas nem sempre verdadeiras e substituição da lucidez por ignorância. Tais mazelas refletem-se na campanha eleitoral, prejudicando a clareza dos discursos e o entendimento das plataformas programáticas dos distintos candidatos.
Tal clima é contrário ao que o Brasil precisa. Há imensos desafios a serem enfrentados pelos governadores, deputados federais e estaduais, senadores e presidente da República a serem eleitos em outubro. Precisamos vencer a estagnação econômica, retomar o crescimento, recuperar os milhões de empregos perdidos na pandemia, debelar a ameaça inflacionária, modernizar a infraestrutura, melhorar a saúde pública e qualificar mais a educação universal gratuita.
O que cada candidato propõe concretamente para o atendimento a essas demandas prioritárias? Ninguém sabe, pois os espaços que têm na imprensa, nas mídias sociais e nos debates é desperdiçado pela retórica vazia, acusações mútuas e verborragia. Poucos têm acesso aos programas de governo de cada postulante. Além disso, a truculência verbal eclipsa as proposições e acaba monopolizando as atenções.
Outro questionamento cabível refere-se à ausência de consultas dos partidos e candidatos aos organismos das máquinas administrativas dos estados, União e seus respectivos legislativos. Desperdiça-se, assim, a preciosa contribuição que poderia ser agregada pelo funcionalismo público de carreira. Esses servidores têm comprovada experiência e conhecimento, podendo dar boas e consistentes sugestões para a formulação de políticas públicas eficazes.
Precisamos avançar na construção dos programas de governo, ter mais serenidade nos debates e consciência do alto significado do exercício da política. O Estado de Direito e o processo eleitoral devem ser respeitados incondicionalmente por todos. É inadmissível qualquer casuísmo que conspire contra as decisões e escolhas soberanas dos eleitores expressas na verdade das urnas.
A democracia é a maior conquista de um povo. Precisamos respeitá-la e fortalecer as instituições. Seu maior momento é marcado justamente pelas eleições, nas quais os cidadãos elegem aqueles que exercitarão o poder político em seu nome. Por isso, são fundamentais propostas claras, menos agressividade e mais urbanidade, para que as pessoas possam entender e escolher os programas que mais atendem às suas expectativas, anseios e perfil ideológico. O país necessita de uma educação democrática, principiando pelos próprios candidatos.
Tal postura de consciência cabe a todos, a começar pelas autoridades e candidatos, que devem dar um exemplo de civismo e respeito às instituições. A perenidade e o fortalecimento da democracia, que nos alinham às nações mais progressistas e avançadas, são fatores condicionantes à viabilização de um Brasil mais desenvolvido e feliz.