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Artigo: Ronaldo e os reis Charles das SAFs

Marcos Paulo Lima
postado em 24/09/2022 06:00
 (crédito: Thomas Santos/Staff Images Cruzeiro)
(crédito: Thomas Santos/Staff Images Cruzeiro)

Ronaldo tem uma baita virtude dentro e fora de campo: a capacidade de antever os lances. Era assim nas quatro linhas. Continua no papel de empresário. Lançar moda é com o Fenômeno. Ousadia não falta. Em 2008, treinava no Flamengo e surpreendeu ao assinar contrato com o Corinthians. Com aquele ato, inaugurou uma nova era de reforços badalados vindos da Europa.

O Flamengo repatriou Adriano. Fez engenharia financeira para ter Ronaldinho Gaúcho. O Fluminense buscou Fred na França. Roberto Carlos uniu-se a Ronaldo no Corinthians. O Santos juntou Robinho a Neymar e Ganso em 2010. O Vasco repatriou Juninho Pernambucano. O Botafogo contratou o holandês Clarence Seedorf.

Aposentado desde 2010, Ronaldo está novamente na vanguarda. Surpreendeu ao se tornar acionista majoritário do Cruzeiro. Inaugurou a era das Sociedades Anônimas de Futebol (SAF). O Toque de Midas transformou o clube mineiro no primeiro case de sucesso desse modelo de gestão. O time celeste está de volta à Série A.

A solução aplicada ao Cruzeiro pode consolidar a revolução em outros clubes quebrados do país — e não são poucos. Dos outros três integrantes do G-4, o Vasco aderiu à SAF. O Bahia está perto de oficializar a mudança.

A ida de Ronaldo para o Cruzeiro inaugurou a caça a um "Fenômeno" para chamar de seu. O resgate do Cruzeiro aumentará a corrida ao mercado em busca de outros milionários. O futebol brasileiro quebrou. Os times precisam de donos e os presidentes do clube assumirão cada vez mais o papel de Rei Charles III: decorativo. Quem lembrou do cartola Sergio Santos Rodrigues no dia da glória?

Há poucos "Ronaldos" na praça. Quem topa brincar de ter clube procura mercados com mais credibilidade. David Beckham é o dono do Inter Miami, franquia da Major League Soccer nos EUA. Pelé do basquete, Michael Jordan comprou o Charlotte Hornets em 2010. Ganhou e perdeu dinheiro. Vendeu parte das ações em 2019. Amargou prejuízo de mais de R$ 1 bilhão em 2021.

O desembarques de Ronaldo no Cruzeiro instaurou a monarquia parlamentarista e torceu narizes de alguns plebeus. Dispensou o goleiro-ídolo Fábio. Abriu mão de Vitor Roque. Demitiu Vanderlei Luxemburgo. O clube contabilizava dívida de R$ 1 bilhão à época. Falência. Três anos na Série B. Daí o mosaico aberto pela torcida celeste, no Mineirão, em gratidão ao mecenas na festa do acesso.

Ronaldo tem a dimensão do risco. Em 2014, anunciou a compra de 10% do Fort Lauderdale Strikers. O time, à época, jogava na segunda divisão dos EUA. Vendeu a participação no clube em 2016 e o time faliu na temporada seguinte. Antes de comprar o Cruzeiro, adquiriu o Valladolid. Desceu e subiu o time na Espanha.

Enquanto o Atlético-MG fazia barulho com seu triplete no fim da temporada passada, o Cruzeiro celebrava, no início deste ano, a possibilidade de se livrar do buraco cabuloso em que as gestões do passado enfiaram o clube. Ronaldo é o troféu. O salvador da pátria nos novos tempos do futebol brasileiro. Mas o desafio será muito maior em 2023.

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