Análise

Artigo: 7 de setembro, oportunidade para mostrar um Brasil grande

OTÁVIO RÊGO BARROS - General da reserva, foi chefe do Centro de Comunicação Social do Exército

Em 14 de julho de 1989, o povo francês comemorou os 200 anos do movimento popular que culminou com a Revolução Francesa, marco civilizatório do mundo ocidental. Para uma data tão especial, François Miterrand, então presidente daquele país, planejou e executou uma festa digna da efeméride.

A avenida Champs-Élysées, ornada por flâmulas tricolores em azul, branco e vermelho, tendo ao fundo o Arco do Triunfo, acolheu dezenas de milhares de cidadãos para assistirem ao desfile comemorativo ao som da Marselhesa. Relembravam o momento no qual o povo, oprimido pela fome, impostos escorchantes, sinecuras da nobreza, desdém da realeza e imposições religiosas tomou a prisão da Bastilha, dando início ao ocaso da monarquia.

O chefe de Estado convidou orgulhosamente diversas autoridades nacionais e internacionais para juntos se curvarem aos ideais emergidos do movimento: igualdade, liberdade e fraternidade. Perfeita oportunidade para mostrar a grandeza daquela nação, em um ato de projeção de poder. E ela não foi desperdiçada.

O Brasil aceitou participar da cerimônia militar e desfilar com uma robusta delegação de Cadetes da Academia Militar das Agulhas Negras e suas congêneres, a Escola Naval e a Academia da Força Aérea. Oficiais e cadetes brasileiros voltaram maravilhados! Paris é de fato cativante.

A Cidade Luz os acolheu como se previsse que no futuro aqueles jovens (hoje, alguns com estrelas de general), injetados da energia emanada pela festa genuinamente patriótica, fossem instados a usar a emocionante cerimônia cívico-militar como um exemplo de organização, na ocasião em que comemoramos o Bicentenário da nossa Independência. Lá não se viu amadorismo ou personalismo menores. Apenas profissionalismo e grande senso de unidade nacional. Nessas ocasiões, é preciso mesmo festejar, e muito. Desde as margens do riacho Ipiranga, quando Dom Pedro nos libertou do jugo português, a nação brasileira amadureceu até se conformar como um país independente de fato, cioso de sua soberania e de seus interesses, e liderança regional aceita pelos vizinhos e irmãos latinos.

Enfrentou resistências à independência, venceu movimentos separatistas, foi à guerra para desagravar patrícios e interesses ofendidos, fez-se República, conviveu com movimentos político-militares ao longo do século 20, não sucumbiu aos ideologismos dos extremos e, agora na adolescência do século 21, se encontra prestes a ultrapassar o arco temporal para mais 100 anos de liberdade e reconhecimento.

Não há razão, portanto, para que a nação, essa força centrípeta de emoções, constituída por seu povo, crenças, valores, cultura e língua, seja empurrada ao abismo da divisão fratricida, patrocinada por políticos que não alcançam o significado ético e moral da união sem ressalvas, neste momento conflituoso para o povo brasileiro.

Mentes rasas, desprovidas de sinapses que unam neurônios da razão e da emoção, desejam que assumamos o comportamento semelhante à turba que invadiu a prisão em Paris e, posteriormente, desfilou enodoada por sangue, com a cabeça do diretor daquela masmorra espetada em lança, pelas ruas da metrópole.

Não podemos ceder a esses impulsos "robespierrianos" que trazem como inspiração tão somente o intuito de destruir para conquistar e manter o poder a qualquer custo. Antes que os ânimos serenassem, muitas poderosas, nobres, arrogantes, belas e inteligentes cabeças rolaram para o fétido saco de aniagem, após a pesada lâmina da guilhotina desconectá-las do corpo. Inclusive a de Robespierre, o diligente carrasco dos próprios companheiros.

A história nos mostra que o Grande Medo, origem do movimento de 1789, foi promovido pelo acúmulo de declarações falsas que geraram instabilidade social, culminando com as mortes e destruições (hoje chamaríamos de fake news). Portanto, neste momento, é na contenção da divulgação de notícias desprovidas de veracidade, conduzidas por mensageiros da desordem, e dos medos que possam disseminar, que devemos começar a nossa preparação para a festa do 7 de Setembro de 2022. Já perdemos muito tempo. A festa é de todos, de todas as raças, de todas as bandeiras, de todos os credos, de todos os pensamentos políticos, de qualquer viés.

Cidadania é ação. Espelhemo-nos em nossos antepassados construtores e mantenedores da independência, desde o longínquo 7 de setembro de 1822. A nação enfrenta insensatos e poderosos antagonismos internos e externos. Precisa estar pronta para se mostrar grande. Paz e bem.