SAÚDE

Artigo: Saúde começa pela boca

Correio Braziliense
postado em 31/08/2022 06:00
 (crédito: Caio Gomez)
(crédito: Caio Gomez)

ROBERTO SEME CURY - Presidente da Comissão de Odontologia da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) e presidente do Associação Brasileira de Planos Odontológicos (Sinog)

Reconhecidos por sua excelência, os dentistas brasileiros estão entre os melhores do mundo. Três das principais faculdades de odontologia do planeta estão aqui. Além disso, temos um profissional para cada 565 habitantes, numa média de dar inveja no exterior. Na Alemanha, essa proporção é de um para 1.282 pessoas. No Reino Unido, a diferença é ainda maior, com a relação de um para 2.325.

Esses números, porém, mascaram uma triste realidade. O que deveria ser motivo de orgulho e razão para que os brasileiros desfrutassem de uma saúde bucal exemplar é, na verdade, um paradoxo. Nada menos que 20% dos dentistas do mundo estão no Brasil, mas, apesar dessa profusão de profissionais e da qualidade que os torna referência no resto do mundo, 34 milhões de brasileiros com idade acima de 18 anos já perderam 13 dentes ou mais. Pior ainda: outros 14 milhões não têm mais nenhum.

Se fosse uma nação, este país de banguelas teria uma população correspondente às da Argentina e do Uruguai juntas, ou quase o quíntuplo dos 10 milhões de habitantes de Portugal. Esse é um dado aterrador porque a falta de higiene e saúde bucal pode levar ao desenvolvimento de quadros gravíssimos como a endocardite bacteriana, causada por bactérias na boca que entram na circulação sanguínea e chegam ao coração, podendo ser fatal. Se essas bactérias seguirem pelas vias respiratórias, podem provocar pneumonia e artrite reumática. No caso de gestantes, há o risco de o parto ser prematuro devido a doenças periodontais originadas de inflamações nas gengivas.

Não é exagero algum afirmar que a nossa saúde começa pela boca, como diz a sabedoria popular. Um plano odontológico custa, em média, R$ 21,50 ao mês, apenas 5% do preço de um seguro de saúde. Trata-se de um investimento baixo considerando-se os benefícios para o nosso bem-estar, com tratamento constante e regular, evitando o surgimento de males maiores e mais graves.

O brasileiro sabe disso e se esforça para se cuidar. Tanto que, nos últimos 12 meses, as operadoras de planos odontológicos receberam mais 2,4 milhões de novos clientes — quase o dobro do registrado pelos planos de saúde — num universo de 30 milhões de beneficiários. Isso tudo a despeito da crise econômica e graças ao esforço do setor, com ofertas ainda mais acessíveis à população.

Entretanto, os números da realidade são duros. Levando-se em conta que 86% dos brasileiros não têm plano odontológico, podemos imaginar o risco corrido pela nossa população e o aumento da pressão sobre o Sistema Único de Saúde. Não há dúvidas de que a higiene bucal precisa ser tratada dentro de uma política de saúde pública.

A gravidade do problema exige ações coordenadas com todos os atores envolvidos — dentistas, operadoras de planos odontológicos e de saúde, sociedade civil e o Estado — para alertar e conscientizar a população sobre os males que podem surgir a partir da falta de cuidados com a higiene bucal. O calendário comporta o Dia Nacional da Saúde Bucal, em 25 de outubro, instituído por lei há 20 anos. Entretanto, a Lei 10.465 limitou-se a criar a data no próprio Dia do Dentista, sem previsão alguma de ações específicas.

Nesse contexto, vemos a importância de campanhas socioeducativas como o Julho Neon, em que as operadoras de planos odontológicos empreendem ações voltadas para os cuidados com a nossa boca, despertando e ampliando a conscientização da sociedade e do Estado.

Nunca é demais repetir: um em cada cinco dentistas do mundo todo estão no Brasil. Temos todos os recursos necessários para vencermos esse desafio. Medidas simples como facilitação ao acesso a itens básicos como escovas e cremes dentais — que poderiam contar com isenção de impostos — aliadas a campanhas em escolas, associações comunitárias e unidades de saúde podem ser fundamentais para evitarmos o agravamento da já tão debilitada saúde pública no Brasil e, quem sabe, possamos em breve resgatar o bem mais precioso do nosso povo, o sorriso.

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