O que não falta no Brasil são leis. Os parlamentares, com o intuito de se exibirem para suas bases eleitorais, são uma máquina frenética de produção de mais e mais marcos legais. Em meio ao cipoal de normas, há inúmeras que "não pegam". Foram feitas à revelia dos interesses de grupos, elaboradas para mostrar proativismo ou porque há governos que as rejeitam desde o nascedouro, e se mexer com o caixa da União, aí tudo fica mais complicado. E é nesta última situação que está a norma que criou o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, que foi vetada pelo presidente da República.
O veto foi derrubado pelo Congresso em março último e parou aí. Até agora, o Ministério da Saúde não definiu regras nem garantiu os recursos necessários à compra e à distribuição de absorventes a adolescentes e mulheres em grave situação de vulnerabilidade socioeconômica. Na comparação com os gastos bilionários para o financiamento de campanhas eleitorais e outras bondades que elevaram as despesas da União, o impacto previsto para a distribuição a 5,6 milhões de mulheres era de R$ 84,5 milhões ao ano com base em oito absorventes por mês/mulher — uma migalha.
Seria assim se os homens também menstruassem? Com certeza, não. Sequer haveria necessidade de norma legal para garantir conforto e bem-estar aos indivíduos masculinos. Mas como o ciclo fisiológico é exclusivo do sexo feminino, digamos que a preocupação é bem menor, ou nenhuma, com o agravante: trata-se de uma parcela da sociedade completamente invisível ao poder e aos poderosos.
O custo da indiferença pode ser bem mais alto do que supõem os detentores do poder e da chave do cofre federal. O uso de papéis, miolo de pão, plásticos e outros procedimentos inadequados durante o ciclo menstrual resultam em doenças — infecção urinária ou cistite, candidíase, infecção vaginal por fungo ou por bactéria —, que levam as meninas e as mulheres ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Outro dano, nem sempre superado, é o afastamento das adolescentes da salas de aula, com prejuízos gravíssimos à formação escolar dessas meninas, que se esforçam para estudar e ter uma formação que lhes permita melhores condições de vida. Aí vem outro problema: a maioria delas é preta ou parda. Mais um barreira para transpor, o maldito racismo estrutural, que compromete a formulação das políticas públicas, preservando ou aprofundando as desigualdades sociais. Neste caso, é preciso que a lei contra a pobreza menstrual "pegue" e, diferentemente de outras, não fique aprisionada no papel. Absorvente para todas!
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