afrorreligiosidade

Artigo: Fé criminosa

Rosane Garcia
postado em 11/08/2022 06:00
 (crédito:  Carlos Vieira/CB)
(crédito: Carlos Vieira/CB)

A democracia pressupõe o diálogo entre os diferentes. O bom senso e a racionalidade conduzem a soluções pacíficas. Não tem sido assim no país. A temperatura se eleva por razões ideológicas, mas, sobretudo, pelo ódio que dividiu a sociedade a partir de 2018. Esse clima de guerra não está restrito à disputa pelo poder, mas é estimulado pelas crenças e denominações religiosas diversas, pela cor da pele ou pelo local de vida das comunidades.

Supõe-se que os deuses de quaisquer confissões de fé se opõem aos conflitos entre os humanos e suas doutrinas, ou dogmas, e defendem a paz entre todos, que é construída a partir do respeito à liberdade de escolha.

A Constituição Federal de 1988 reconheceu a pluralidade religiosa característica do Brasil, que abriga expressiva diversidade étnica e pessoas de diferentes origens, com culturas singulares. Toda essa mistura étnico-cultural-religiosa está na composição do tecido demográfico do país. Não respeitar essas diferenças é dividir a sociedade em retalhos.

A intolerância religiosa foi reconhecida como crime, com punição de um a três anos de reclusão e multa, segundo o artigo 208 do Código Penal. Conforme a lei, comete a infração quem "escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso".

Comparar as religiões de matrizes africanas às "trevas", a fim de depreciar adversários políticos, é incitar as agressões e compactuar com as barbáries dos fundamentalistas que invadem e destroem as casas de candomblé e de umbanda.

As recentes ofensas à afrorreligiosidade são mais um indicativo do racismo incrustado em parcela da sociedade que alimenta as ações de grupos truculentos e signatários das cartilhas que marginalizam pretos, pardos e até os brancos adeptos das religiões de matriz africana. As agressões revelam uma grande limitação de conhecimento em relação à história do país e sua formação cultural. É lamentável que livros sagrados sejam transformados em artefatos bélicos.

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