O governo comemora as projeções que apontam para deflação nos índices de inflação de julho e, muito provavelmente, de agosto, mas nem de longe a carestia deixou de ser um grande problema no país. Muito pelo contrário. Basta uma rápida ida aos supermercados ou às feiras livres para constatar como está difícil levar comida à mesa por parte da população. Os salários estão tão corroídos, que itens que antes eram dispensados nas fábricas, como o soro de leite, têm substituído o produto final. Uma caixa de leite está custando R$ 10.
A queda da inflação nesses dois meses refletirá a limitação da cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incidentes nas faturas de combustíveis, energia elétrica e telecomunicações. Também será impactada pelas duas recentes reduções nos preços da gasolina anunciadas para a Petrobras. É importante, porém, ressaltar que, para os trabalhadores mais vulneráveis, o custo de vida se mantém o mesmo, uma vez que quase a totalidade de seus rendimentos vão para a compra de comida.
O IPCA-15, a prévia da inflação oficial de julho explicitou bem essa realidade. Enquanto o resultado final do índice coletado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ficou em 0,13%, o grupo alimentação e bebidas computou alta média de 1,16%, quadruplicando em relação a junho (0,25%). Anualizada, a inflação dos alimentos encosta nos 15%. É muito para quem sobrevive com tão pouco. Esses números, por sinal, consolidam a visão de que a queda dos preços dos combustíveis favorecerá, mais imediatamente, as classes média e alta, que não abrem mão do uso do carro para a ida ao trabalho e às compras.
Não se deve diminuir o que foi feito pelo governo. Pelo contrário. Mas é fundamental assinalar que a inflação está longe, muito longe de dar alívio aos mais pobres, que representam mais de 50% do eleitorado. O aumento do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 a partir de agosto dará um fôlego às famílias mais sofridas, contudo, o adicional chega atrasado, pois o estrago feito pela carestia no orçamento dos lares já está feito. No máximo, pode-se dizer que os R$ 200 a mais no benefício ajudarão os mais vulneráveis a tirarem, temporariamente, a cabeça para fora d'água. Um paliativo se a carestia continuar rodando acima de 10% ao ano.
Pelo histórico da inflação no Brasil, não há espaço para a complacência com reajustes disseminados, como se vê agora. Menosprezá-la é abrir caminho para que o pior cenário se confirme. O Banco Central tem feito a sua parte, ao aumentar sistematicamente a taxa básica de juros (Selic), que saltou de 2%, no início de 2021, para 13,25% ao ano. Dada a resistência do custo de vida, que deveria estar rodando em torno de 3,5%, segundo as metas definidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), os mais pessimistas falam que o aperto monetário poderá ir até 14,25%, nível observado no governo de Dilma Rousseff.
Todos devem ficar atentos: com inflação não se brinca. De nada adiantará pagar Auxílio Brasil de R$ 600 ou mesmo de R$ 1 mil se os reajustes continuarem tão presentes no dia a dia dos consumidores. Portanto, que o governo e a sociedade façam o possível para debelar esse mal que, ressalte-se, afeta o mundo todo. Os mais vulneráveis agradecerão.