Visão do Correio: Retratos do Brasil

A palavra golpe está presente em quase todas as conversas.

Dentro de um mês, começa oficialmente a campanha eleitoral no Brasil. Nunca o mundo esteve tão atento ao destino político do país, que vive uma polarização sem precedentes. É visível o temor entre agentes do mercado financeiro, empresários, autoridades e acadêmicos de várias partes do planeta, em especial, da Europa, sobre os rumos que a maior democracia da América Latina pode tomar. A palavra golpe está presente em quase todas as conversas.

A preocupação em relação ao Brasil ficou evidente durante recente passagem de cinco ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) por Portugal. Todos, incluindo André Mendonça, indicado à Corte pelo presidente Jair Bolsonaro, foram sistematicamente questionados quanto aos riscos de ruptura democrática no país. Em períodos de normalidade, isso jamais aconteceria. Os ministros se limitariam a falar do funcionamento e das diretrizes do Judiciário brasileiro, nada além do tecnicismo característico a esse Poder.

A visão geral é de que, ao menor sinal de desleixo da sociedade, os que não pregam a democracia podem dar as cartas. Portanto, os eleitores devem ficar atentos e afastar os riscos de se repetirem no Brasil aberrações como as que se veem atualmente na Hungria e na Polônia. Nesses países, associados à União Europeia, governos de extrema-direita passaram a perseguir opositores, cooptaram o Judiciário e disseminaram uma onda de xenofobia assustadora. São exemplos aos quais o Brasil deve ficar atento para não os repetir, alertaram os ministros do STF.

De longe, mas atento ao que se passa na política brasileira, o mundo pensante espera que a democracia prevaleça, e que o resultado das urnas seja respeitado, qualquer que seja ele. Seria dramático demais o país caminhar para uma autocracia ou mesmo recorrer a atos como a invasão do Capitólio, templo do regime democrático dos Estados Unidos, em janeiro de 2021. Retrocessos levarão o Brasil a um isolamento da comunidade internacional.

Os que acompanham com mais afinco o andamento das eleições brasileiras ressaltam que não foi por bravata ou picardia que um parlamentar norte-americano propôs, recentemente, um projeto proibindo a parceria entre as Forças Armadas dos Estados Unidos e as congêneres brasileiras, caso os fardados tupiniquins se aliem aos que defendem o desrespeito às instituições e a ruptura democrática. É um alerta contundente de como o mundo vê com preocupação o direito básico previsto na Constituição de os brasileiros elegerem seus governantes.

A radicalização política também coloca em suspense o futuro da economia brasileira. Com o mundo flertando com a recessão, o capital produtivo tenderá a ser mais seletivo na hora de definir para onde vai. Democracias sempre têm prioridade. É importante lembrar que o Produto Interno Bruto (PIB) do país cresceu, em média, apenas 0,3% ao ano na última década. As projeções internacionais apontam para incremento próximo de 1% em 2022; e de 0,5% em 2023. Aventuras antidemocráticas empurrarão o Brasil para um quadro muito mais dramático economicamente.

O desenrolar da campanha eleitoral e, consequentemente, as votações estarão no radar de autoridades mundiais, que defendem que o pleito de outubro próximo seja acompanhado por organismos multilaterais para endossarem toda a lisura do processo. Não se tratará de interferência indevida, mas de mostrar ao planeta o quanto a democracia brasileira é fundamental para o funcionamento da ordem global.