Editorial

Visão do Correio: Mais rigor com os feminicidas

O crime de feminicídio, motivado por razões de gênero, vitimou 1.341 mulheres no ano passado. Uma redução de 1,7% na comparação com 2020. A maioria delas (68,7%) estava na faixa etária entre 18 e 44 anos, e 62% eram negras. O ambiente doméstico, em 65,6% dos casos, foi o palco da brutalidade. Os assassinos eram companheiros ou ex em 81,7% dos episódios, e em 14,4% um parente da vítima, segundo o estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

A fim de conter essa barbárie no país, por unanimidade, os 24 integrantes da Comissão de Constituição de Justiça do Senado aprovaram ontem projeto de lei que veda os argumentos de legítima defesa da honra e morais para favorecer acusados de feminicídio em julgamento por tribunais de júri. Ante o consenso dos senadores da CCJ, o projeto não deverá ser apreciado pelo plenário e seguirá para votação pela Câmara dos Deputados. Se aprovado, será encaminhado à sanção do presidente da República.

O projeto, de autoria da senadora Zenaide Maia (Pros-RN), modifica também as regras do Código Penal (CP) que poderiam atenuar a punição dos autores de feminicídio e de violência doméstica e familiar. Nesses casos, as penas não serão reduzidas por motivo de relevante valor social ou moral, como previsto no CP. Ainda, segundo o PL, os argumentos de que o crime foi motivado "por relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima" não reduzem a punição dos acusados.

O endurecimento da lei é seguido da expectativa de que ele inibirá a truculência masculina contra as mulheres. Igual pretensão tiveram os legisladores tanto na aprovação da Lei Maria da Penha quanto na definição do feminicídio e das sanções penais. Mas a ampliação do rigor frustrou, em parte, o objetivo pretendido. Entre 2020 e 2021, foram registrados 230.861 casos de agressões domésticas; 597.623 ameaças; e 619.353 pedidos de socorro por meio do 190. A Justiça concedeu 370.209 medidas de proteção de urgência (MPU) em favor de mulheres ameaçadas pelos ex ou atuais companheiros.

Embora as medidas coercitivas sejam importantes para proteger a integridade física, emocional e mental das mulheres, elas revelam uma falência nas relações entre as pessoas. Indicam que a "coisificação" da mulher ainda está muito presente no universo masculino, impregnado pelos ultrapassados conceitos derivados do machismo.

Não basta mudar a lei e tornar as punições mais severas. É preciso reeducar as pessoas para que haja uma relação de respeito entre os casais. Trata-se de um processo que começa nos lares, segue pelas escolas e permeia todos os setores da sociedade. Esse respeito não deverá valer apenas entre homens e mulheres, mas se estender às diferentes orientações de gênero.

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