Há 20 anos, Marcos André Batista Santos, o volante Vampeta, dava cambalhotas na rampa do Palácio do Planalto com uma camisa preta número 9 do Corinthians — sob aplausos perplexos do então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso. A cena surpreendente, para dizer o mínimo, tinha um significado histórico para a capital do país. Fechava um ciclo. O penta havia nascido um ano antes, no Distrito Federal.
Luiz Felipe Scolari foi o primeiro técnico da Seleção a tomar posse em Brasília. Era 12 de junho de 2001. Com os 13 pedidos de indiciamento do então presidente da CBF, Ricardo Teixeira, no relatório da CPI da CBF-Nike, Felipão deixou o Cruzeiro para trás e embarcou de Belo Horizonte rumo ao nosso quadrado. Recebido pelo motorista do cartola no Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, partiu no carro de Teixeira rumo à embaixada da Confederação Brasileira de Futebol em uma mansão, na QI 15 do Lago Sul. A residência alugada havia virado sucursal da entidade. Vinte anos depois, tem novos donos. Lá, o gaúcho de Passo Fundo conheceu o conterrâneo que deu o primeiro tempero à campanha do pentacampeonato.
Dono do antigo restaurante La Massas, no Gilberto Salomão, Danilo Pretto era o Chef da Casa da CBF. Coube a ele e ao primo, o garçom Ivanor, preparar o almoço de Felipão. Bons de ouvido, ambos testemunharam as conversas de um treinador faminto por uma picanha — e pela conquista da quinta estrela.
Antes de ser apresentado à imprensa, Felipão reuniu-se na Casa da CBF com o presidente Ricardo Teixeira, o secretário Marco Antônio Teixeira e o vice-presidente pela Região Centro-Oeste, Marcos Vicente. O copeiro perguntou a Felipão se ele gostaria de tomar algo. O treinador exalou simpatia ao pedir cinco cafés. Mas havia quatro pessoas no encontro?! O técnico explicou carinhosamente que uma das xícaras seria justamente para o garçom que gentilmente o atendia.
As testemunhas oculares da história ouviram Felipâo dar sinal verde presencialmente, olho no olho, em 10 minutos, ao desafio de assumir a Seleção Brasileira. Sincerão, ele impôs uma condição definitiva: "Não aceitaria pitacos de cartolas. Depois disso, ele prometeu trazer o caneco", contou-me Danilo Pretto.
Para alegria geral da nação, a reunião não acabou em pizza. O acordo foi sacramentada à moda gaúcha. "O Felipão pediu uma picanha uruguaia ao ponto". Danilo conta que Felipão estava tão feliz, que gastou o idioma italiano com Ivanor sobre a culinária do Rio Grande do Sul. Falou de polenta, galeto... Um dos presentes confidencia: Scolari teria dito que jamais havia degustado uma picanha tão saborosa como aquela.
Lembranças tão pequenas deles dois — Danilo e Ivanor —, da tarde em que Felipão deixou Brasília com água na boca pelo penta. Trezentos e oitenta e cinco dias depois da posse no Lago Sul, a Família Scolari fazia rolar a festa na capital. E o "sóbrio" Vampeta dava cambalhotas na rampa do Planalto.