Editorial

Visão do Correio: Desigualdades inaceitáveis

Se a crise sanitária fechou a economia e atingiu em cheio segmentos econômicos nos quais as mulheres estão mais presentes, como o de varejo, agora, elas são as principais vítimas da inflação.

Correio Braziliense
postado em 17/07/2022 06:00
Pesquisa diz que 33 milhões de pessoas passam fome no Brasil. Erika Priscila Souza Cabral , moradora do Bairro Santa Luiza na Cidade Estrutural. -  (crédito:  Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
Pesquisa diz que 33 milhões de pessoas passam fome no Brasil. Erika Priscila Souza Cabral , moradora do Bairro Santa Luiza na Cidade Estrutural. - (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

A disparidade de gêneros no mundo continua assustadora. Apesar da ligeira melhora nos indicadores em 2021, como acesso à saúde a à educação, ainda serão necessários, ao ritmo de hoje, 132 anos para que homens e mulheres tenham as mesmas condições no mercado de trabalho, rendas semelhantes e participação idêntica na política. Os dados, revelados por um levantamento do Fórum Econômico Mundial, apontam o quanto governos e empresas precisam avançar no sentido de uma sociedade mais justa e igualitária.

O desafio se tornou maior depois da pandemia e diante da guerra na Ucrânia. Se a crise sanitária fechou a economia e atingiu em cheio segmentos econômicos nos quais as mulheres estão mais presentes, como o de varejo, agora, elas são as principais vítimas da inflação. Além de ganharem bem menos do que os homens, são chefes de família — a grande maioria, de baixa renda. Portanto, correm o risco de caírem mais rapidamente na miséria e de não terem como sustentar seus filhos. Esse quadro já é visível em muitos países, inclusive, no Brasil.

Infelizmente, no ranking de 146 nações pesquisadas pelo Fórum Econômico Mundial, o Brasil está muito mal posicionado, em 94º lugar. É verdade que, em dois dos quesitos analisados, saúde e educação, o país aparece no topo da lista. Mas escorrega feio quando se mede a presença das mulheres no mercado de trabalho e as oportunidades dadas a elas (85º no estudo). Também deixa a desejar a presença de mulheres em cargos eletivos, sobretudo, para o Congresso (104º). No Senado, especificamente, elas ocupam somente 12 dos 81 assentos.

Olhando apenas para América Latina e Caribe, de 22 países, o Brasil está na 20ª posição, à frente de Belize e Guatemala. Ou seja, machismo, preconceito, desrespeito e violência continuam prevalecendo em relação a elas. Não à toa, o país lidera as estatísticas de estupro, especialmente de meninas de 10 a 13 anos, e de feminicídio. Também são extremamente comuns os casos de assédios moral e sexual nas empresas, independentemente de seu porte. Um dos casos mais emblemáticos é o da Caixa Econômica Federal, cujas denúncias resultaram na demissão de Pedro Guimarães da presidência da instituição pública.

De posse dos dados da pesquisa e do avanço lentíssimo na redução da disparidade de gêneros — entre 2020 e 2021, houve recuo de apenas quatro anos no tempo estimado para que a igualdade prevaleça —, a diretora Administrativa do Fórum Econômico Mundial, Saadia Hahidi, diz é preciso urgência na busca por uma sociedade mais diversa e menos desigual. Isso passa por políticas direcionadas a apoiar o retorno das mulheres ao mercado de trabalho e pelo desenvolvimento de talentos femininos da indústria do futuro.

Não é só. O mundo não pode permitir retrocessos como o acesso à educação por parte das meninas. É necessário que elas concluam o ciclo completo de estudo, de forma a não perpetuarem a pobreza. Em várias partes do mundo, em especial em países como Paquistão e Afeganistão, o direito delas de frequentarem as salas de aula está cerceado. Isso explica, por sinal, o fato de esses dois países estarem no fim do ranking de desigualdades de gêneros.

No Brasil, as meninas frequentam as escolas, mas se tornou comum casos de estupros por parte de colegas nesses ambientes nos quais elas deveriam estar protegidas. No Rio de Janeiro, especificamente, uma menina é violentada a cada 36 horas em escolas. Calar-se diante disso é empurrar o país para a barbárie, que, ressalte-se, está cada vez mais presente, quando somos expostos a cenas repugnantes de um médico anestesista colocando o pênis na boca de uma mulher sedada, que passava por uma cesariana. Se esse Brasil prevalecer, com certeza, todas as brasileiras, independentemente da condição social, da religião e da ideologia, estarão condenadas ao que há de pior. É preciso agir rápido.

 

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