Utopia
Dói saber que o mundo vive uma fase distópica. O azedo e o amargo encontram-se em demasiada oferta. Porém, a humanidade deu mostras de que pode sobreviver aos humores do plano desencantado. Em situações de encruzilhada, Machado de Assis (1839-1908) combinou "a pena da galhofa" com "a tinta da melancolia" e, assim, materializou o melhor meio para "entender" o Brasil: a ironia. Se não temos a seriedade a nosso favor, como acusa o viralatismo de plantão, o país tem o riso como luta e dança consagradas. Há quem trate a esperança como se fosse um puro devaneio irrealizável. Há realidade de sobra no dia a dia do brasileiro. Elogiemos os idealistas, os sonhadores e os românticos! O aprender da utopia é justamente o combustível responsável pelo andamento das realizações mais ousadas e atrevidas. Êxito concreto e brilhante todo ser pode experimentar. Carecemos de um país repleto de educação permanente e cidades educativas. A pior das doenças já foi identificada: "A espera por um tédio eterno" — sinaliza Daniel Gomes de Carvalho, em Filosofia para mortais: pensar bem para viver bem (2020). Bem-estar físico, mental e social colocam a vida humana muito próxima da plenitude. Sensacional, porém, é dar A volta ao mundo em 80 dias. O escritor francês Júlio Verne (1828-1905) contou muito bem essa história. Trata-se de outra delícia a vida espichada pelo encanto da invenção artística. A violência, eterna vara de marmelo, nunca será uma varinha de condão. Com magia, o poeta Mauro Rocha realiza o impossível, e o maravilhoso acontece: "Sinfonia n.º 30/Eu quero viver/Nos Girassóis da Rússia/Minha infância foi/Na Terra do Nunca/Minha adolescência teve/Um Encontro Marcado/Tornei-me adulto/Sem Lenço e Sem Documento/Eu quero morrer ao som/Do Bolero de Ravel" (Curta poema curto, 2020).
Marcos Fabrício Lopes da Silva,
Asa Norte
Emenda constitucional
Observo, perplexo, como cidadão apartidário, o desenfreado escarcéu de alguns setores, contra a proposta de emenda constitucional (PEC) destinando auxílios para diversos segmentos da sociedade. Irados, insultam e debocham da iniciativa, chamando-a de "PEC da bondade", "PEC do desespero", "PEC kamikaze" e outras exageradas tolices. Ninguém de bom senso pode ficar insensível e indiferente à fome, à miséria, ao desemprego e ao despejo que atravancam o crescimento do país, destruindo milhões de famílias e sonhos de crianças famintas. Faz mal aos olhos e ao coração pais e avós com crianças, pedindo esmolas nas ruas, quando deveriam estar estudando e os adultos trabalhando. A brutal e avassaladora pandemia agravou a situação. Diante do atual quadro social de horrores, aflições e desesperanças, nenhum outro chefe da nação, em sã consciência, deixaria de propor ao Congresso semelhantes medidas. Não existe mágico, cartola nem coelho para tentar sanar as atuais dificuldades de outra maneira. Dependendo dos argumentos e competência dos candidatos, as providências adotadas terão reflexos nas eleições de outubro. Muitos poderão ser taxados como adeptos da fome e da miséria. O jogo é jogado e lambari é pescado.
Vicente Limongi Netto,
Lago Norte
Música
Até o fim dos anos 2000, a imagem da indústria da música era a de mercado em decadência. As vendas de álbuns, o pilar de seu modelo de negócios, haviam perdido o sentido depois do surgimento da música digital, distribuída e compartilhada pela internet (muitas vezes, ilegalmente). Naquela época, poucos investidores em sã consciência colocariam suas fichas nesse segmento apostando numa recuperação. Passados mais de 10 anos, o que se vê é exatamente o oposto. A receita da indústria fonográfica não apenas parou de cair como vem crescendo num ritmo que não era visto havia muito tempo. A virada é puxada pelo crescimento dos aplicativos de música streaming, que oferecem um amplo acervo pelo preço de um único álbum por mês. Enquanto as vendas de CDs continuam caindo, o faturamento com os serviços de streaming explodiu nos últimos anos e chegou a 14 bilhões de dólares em 2020. A dominância do streaming no setor musical causou impacto até na forma de compor as canções. Elas tem ficado mais curtas. Cada vez que alguém ouve uma música, é gerado um valor pequeno, inferior a 1 centavo de dólar, para gravadoras e artistas. Portanto, uma música precisa de milhões de reproduções para ser lucrativa. O Brasil não tem empresas relevantes no mercado global de streaming de música. A de maior renome é a gaúcha Superplayer, que oferece um serviço baseado em listas temáticas. Infelizmente, esse é um mercado consolidado e dominado pelas plataformas estrangeiras.
Renato Mendes Prestes,
Águas Claras
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