Nada em nosso país está tão ruim que não possa, de algum modo, ser piorado. É com esse tipo de pensamento niilista que vamos, a cada ano, escorregando ladeira abaixo, indo ao encontro do fundo de um poço lamacento que cavamos com nossos próprios pés.
Curioso é notar que essa travessia descendente tem sido, na maioria das vezes, obra e engenho de nossa elite política. É o que temos e o que merecemos ter por não dar a importância devida ao ato de votar. Sabedores desse nosso desdém histórico pelo próprio destino, nossos representantes, há muito, descobriram que melhor e mais proveitoso é representar-se a si mesmo, retirando da função política o máximo de proveito possível.
E assim, nós, o povo representado, vamos a cada novo pleito, elegendo para os mais altos postos da máquina do Estado, indivíduos que empreenderão todos os esforços para representar a si e aos seus, deixando o eleitor sentado à beira do cais, a ver navios pelos próximos quatro anos. A desfaçatez e a coragem com que alguns da nossa classe política agem em proveito próprio só encontram paralelo, em sentido contrário, com nossa timidez. O alvoroço agora é em torno da chamada PEC das Embaixadas, que abre caminho para os parlamentares ocuparem cargos de embaixador, mesmo sem ter que renunciar aos mandatos. Caso venha a ser aprovada, como querem os senadores, antes mesmo das eleições, a emenda nos levará à seguinte situação esdrúxula: o político é eleito para representar os cidadãos ou seus estados, não representa nem um nem outro e mesmo antes de atuar para a função para a qual foi eleito, vai ser embaixador, inclusive, no charmoso circuito Elizabeth Arden, que compõe as representações em Paris, Londres, Roma e Washington. Tudo isso sem ser do métier diplomático, sem falar outra língua, sem preparo e traquejo. Ou seja, vai fazer feio lá fora, ajudando a piorar a imagem do país, como se isso fosse ainda possível.
Na melhor das hipóteses, os novos embaixadores biônicos, uma gente que sabidamente não seria aprovada num concurso para o Rio Branco, representarão a si mesmos, deixando as relações internacionais do país para os entendidos desse delicado assunto. Não será surpresa se o texto for aprovado. Surpresa desagradável pode ocorrer caso algum país, depois de analisar a folha corrida do futuro representante do Brasil, não conceder o agrément.
Num país sério, esse tipo de proposta, que pode colocar os interesses da nação em jogo, não seria, sequer, apresentada. Temos, internamente, muitos motivos para nos envergonhar. Querer levar essa afronta ao bom senso além das fronteiras é que não dá.