Avisem por aí que o "fantasma" do comunismo não assusta ninguém. Aliás, avisem que o comunismo, na acepção clara do termo, ruiu quando o Muro de Berlim desabou, em 9 de novembro de 1989, arrastando a cortina de ferro. O "bicho-papão" criado por Marx e por Engels perdeu a batalha para o capitalismo. Hoje, muitos se esforçam para associar a esquerda a uma Venezuela que, dizem, foi combalida pelo socialismo de Hugo Chávez e de Nicolás Maduro. Apesar de o partido governante levar o nome "socialista" — Partido Socialista Unido da Venezuela —, a revolução bolivariana não se desvincula dos lucros do petróleo. Na acepção mais pura do termo, o comunismo foge do lucro como o diabo da cruz.
Vão dizer que Cuba é comunista. Mas a ilha, ainda antes da morte de Fidel Castro, começou a implementar reformas econômicas, em abertura ao capital. Talvez aleguem que a China seja comunista. Mas o país de Mao Tsé-tung, de Deng Xiaoping e de Xi Jinping não se tornou uma megapotência sem se curvar ao lucro. E a Coreia do Norte? A dinastia dos Kim somente sobrevive graças a uma tutela tirânica do poder.
A histórica eleição do ex-guerrilheiro Gustavo Petro, na Colômbia, assinala uma tendência de mudança na América Latina. O primeiro presidente de esquerda do país invocou, em seu discurso de vitória, um ponto-chave que aterroriza a direita radical: a justiça social. A distribuição justa de renda deixou de ser utopia para se tornar urgência. "A partir de hoje, a Colômbia muda. A Colômbia é outra, uma transformação real. É a política do amor", declarou Petro. Sua vice, Francia Márquez, anunciou: "Conseguimos um governo dos 'ninguéns' da Colômbia."
A postura de Rodolfo Hernández, um milionário que foi adotado pela direita, merece aplausos. O candidato derrotado parabenizou Petro e estendeu-lhe a mão. Muito acima de questões ideológicas, ali estava em jogo o futuro da Colômbia, um país que começa a trilhar uma perspectiva de paz depois de décadas de um conflito armado sangrento. Após o indiscutível triunfo de Petro, vale uma reflexão: a demonização de correntes ideológicas não tem outro efeito que não seja o de aprofundar o ódio.
Ao invés de recriminar a esquerda ou a direita, o povo precisa examinar se o governante, seja lá de qual corrente for, tem contribuído para o progresso e se revestido do papel de um líder nato. Isso vale adotar uma retórica que aglutine. Se as autoridades apresentam reformas para controlar a inflação e promover a paz social. Mais: se estão comprometidas com a redução das desigualdades. É preciso que a brisa que vem do noroeste da América do Sul toque as mentes ao sul. Em pouco mais de três meses, o Brasil escolherá o próximo presidente. A maior nação do Hemisfério Sul precisa votar de forma consciente. Sem se preocupar com falsos fantasmas ou rótulos que nada fazem a não ser estigmatizar.