O Brasil, país continental que se desloca e transporta sobretudo pelo asfalto, sente com o envelhecimento e a falta de investimentos o peso de uma malha viária predominantemente projetada em meados do século passado, cujos remendos já não suportam os incrementos do tráfego, seja em termos de volume, peso ou da tecnologia que despeja veículos cada vez mais potentes em traçados e estruturas cada vez mais ultrapassados. Exemplos do resultado dessa equação, que conta ainda com a variável representada pela imprudência dos motoristas, aparecem em estatísticas de acidentes como as produzidas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) ou pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT), ao totalizar os desastres ocorridos em 2021.
Um dos resultados surpreendentes desse mapeamento surge da identificação de uma nova "Rodovia da Morte" na BR-040, estrada que liga o Distrito Federal ao Rio de Janeiro passando por Minas Gerais. Segundo dados do Anuário Estatístico 2021 da PRF, revelados em reportagem do jornal Estado de Minas, dos Diários Associados, a rodovia tem entre Simão Pereira, na Zona da Mata mineira, próximo à divisa com o Rio, e Paracatu, quase na divisa com Goiás, o trecho mais letal entre todas as estradas brasileiras.
São 850 quilômetros de asfalto que produziram no ano passado, segundo a PRF, um caso fatal a cada 12 acidentes. Desastres que se espalham por um trajeto que conjuga — sobretudo nos trechos não duplicados — vias sinuosas e percursos sem acostamento ou com a via lateral de emergência erodida. Sem contar o tráfego pesado, que combina os riscos dos fluxos urbano e rodoviário principalmente nas áreas mais populosas.
Pelo direito de percorrer essa corrida de obstáculos e armadilhas por vezes letais, o motorista desembolsa quase R$ 130 apenas em tarifas de pedágio pagas em 10 praças, caso faça o trajeto de ida e volta. Nove delas estão no trecho administrado pela Via-040 (R$ 5,80 de cobrança em cada cancela, para veículos simples) e uma fica sob responsabilidade da Concer, que cobra preço mais salgado: R$ 12,60 por automóveis e utilitários leves.
O primeiro lugar no ranking que garante o título de "Rodovia da Morte" não é motivo de orgulho, mas pode ser ostentado por várias rodovias país afora, dependendo da estatística que se aborda. Se a BR-040 ocupa o posto quando o assunto é letalidade por volume de acidentes, em números absolutos a campeã é a BR-116, que corta o Brasil do Rio Grande do Sul ao Ceará, em cerca de 4,5 mil quilômetros que produziram apenas no ano passado 690 mortes, segundo o Painel CNT de Acidentes Rodoviários de 2021.
O mesmo estudo mostra que o país jogou no asfalto somente no ano que passou R$ 12.193.110.373,71 em despesas estimadas com os acidentes ocorridos apenas nas rodovias federais. São R$ 4,7 bilhões projetados em gastos com desastres fatais e outros R$ 7 bilhões com aqueles que não deixaram mortos, mas resultaram em ferimentos a vítimas. O custo emocional para amigos e parentes das 5.391 pessoas que tiveram as vidas ceifadas repentinamente nas BRs do país no curto período de 12 meses não entra em contas, porque é impossível de ser estimado.
São dados de uma tragédia diária que ocorre em meio a projetos não concluídos, denúncias de desvios ou irregularidades, traçados superados, asfalto sem manutenção e obras ultrapassadas ou degradadas, que continuam produzindo vítimas em 2022. E continuarão pelos próximos anos ou décadas, a menos que a soma de planejamento de curto, médio e longo prazos, definição de prioridades e investimento público responsável, assim como a cobrança de obras assumidas em contrato pelas concessionárias, possam, enfim, pôr freio à carnificina.
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