Não vou por aí

Correio Braziliense
postado em 25/06/2022 00:01

Como dizia José Régio, in Cântico Negro: "Não, não vou por aí! Só vou por onde/Me levam meus próprios passos...Se ao que busco saber nenhum de vós responde/Por que me repetis: 'vem por aqui!'? Prefiro escorregar nos becos lamacentos, /Redemoinhar aos ventos, /Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,/A ir por aí..."

Em pleno século 21, a humanidade, temerosa das imensas responsabilidades que tem pela frente, num planeta em grande ebulição, insiste em permanecer estagnada, dentro de uma fase evolutiva que muito se assemelha à adolescência, oscilando entre a infância e a maturidade, receosa em ter que assumir as rédeas do próprio destino, livrando-se definitivamente da tutela de políticos.

De fato, um novo século para a humanidade só virá quando ela adquirir a capacidade plena de andar sem essa muleta, liberta de intermediários, que no final das contas são também seus carcereiros. Um olhar em volta, mostra que ainda estamos longe desse dia. As guerras e os extremismos políticos, representam bem essa eterna adolescência. As desigualdades sociais e a violência reafirmam, por hora, nossa dependência e amarras à esses títeres.

Não somos o que somos. Estamos resumidos a sermos aquilo que querem que sejamos e assim seguimos sem vontade, ao sabor do empurrão dos ventos. A própria democracia, como a temos, é ainda o menos aflitivo modelo que encontramos para delegar nossas responsabilidades sem nos responsabilizarmos pelo que virá.

E é aí que as coisas tomam os rumos que não desejamos. No nosso caso particular, passados os quatro anos de governo, com mudanças nos Poderes Executivos e Legislativos de todo o país , nenhum dos eleitores se apresenta perante a justiça para confessar seus crimes por haver eleito esse e outro mandrião, esse e outro corrupto, ficando o passivo dessa irresponsabilidade dividida por todos igualmente, numa punição que se repete ad infinitum a cada quadriênio.

Por isso, falar em esquerda e direita num país que não sabe sequer seguir em frente e em linha reta, rumo ao futuro, é como torcer em vão pela vitória vazia na disputa entre o Boi Garantido, de vermelho, e o Boi Caprichoso, de azul.

De olhos postos nesse ludopédio enfadonho, nesse verdadeiro Fla-Flu desnecessário, entregamos de bandeja, todo um país e toda uma nação nas mãos de muitas autoridades que demonstram desdém com a própria sorte.

Não se enganem. Somente eleitores notoriamente irresponsáveis e imaturos delegam o destino de suas vidas e de seus familiares àqueles que irão, na primeira oportunidade, roubar-lhes a carteira e a vida. É nessa disputa que rumamos para outubro, certos de que vamos no bom caminho. Afinal seguimos em círculo e sem enxergar um palmo à frente. Só escutamos a gritaria dizendo: vem por aqui. Tivéssemos algum juízo, há tempos teríamos gritado de volta: não, não vamos por aí. Seguiremos para onde dizia o filósofo de Mondubim: "Para o rumo da venta!"

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