Por Aldo Paviani - Geógrafo e professor emérito da Universidade de Brasília
Os dias frios em pleno mês de junho indicam como será o inverno de 2022. Ao que parece, as temperaturas baixas nos mostram um inverno rigoroso e a possibilidade de muitos brasilienses enfrentarem problemas mais severos de saúde, pois, com o frio, temos, estranhamente, baixa umidade relativa do ar. Isso leva a problemas pulmonares ou respiratórios e, como a mídia indica, igualmente, complicações cardíacas para quem previamente sofria desse mal.
Mas o pior é mesmo para os desvalidos, que não têm um abrigo (a mitológica casa própria). Vivem ao deus-dará e se recolhem sob marquises de prédios comerciais ou de instituições públicas. Poucos deles desfrutam de almoço ou de uma sopa noturna para se nutrirem. Isso escancara a desigualdade social secular que nós, brasileiros, não conseguimos eliminar ao longo dos anos. Seja por falta de políticas públicas, seja por "descuidos" da iniciativa privada.
O problema não parece ser de ninguém: o governo federal joga a batata quente para os estados e municípios, que têm secretarias de desenvolvimento social; enquanto estes não cumprem o dever de separar verbas para os indigentes e os que estão em situação de rua — um eufemismo da casa grande, que assim se refere aos empobrecidos e desvalidos, possuidores de cobertor curto e de pratos meio cheios ou vazios para as suas refeições. Os setores da economia não enxergam esses brasileiros como força produtora e, por consequência, como cidadãos que têm necessidades de consumo. Portanto, a pergunta é: como mudar esse quadro?
Os Estados Unidos da América, sob o comando do presidente Roosevelt, elaboraram, ainda nos anos 1930, o new deal, um conjunto de medidas para o país sair do terremoto econômico e social. A partir daí e dos esforços bélicos, os americanos fizeram o dever de casa, levando o país a se tornar uma grande potência. No Brasil, nada de parecido foi realizado até o momento, embora tenhamos milhares de pessoas necessitadas. Não há políticas públicas no sentido de pelo menos dar oportunidade salarial para que o brasileiro pobre possa conquistar três refeições diárias para si e para os familiares. E, assim, no frio do inverno que se aproxima, antevendo-se que será rigoroso, muitos desvalidos estarão sob marquises ou sob frondosas árvores para se abrigar, contando que o período seco não acabe com chuvas torrenciais. Torcem também para que pessoas beneméritas ou instituições de caridade surjam com a sopa quente nas noites frias desta época do ano.
Muitos contam apenas com essas iniciativas para alimentar-se. Enquanto isso, o país tem milhões de desempregados, sendo que desses mais de 3 milhões e meio (ou 29% do total de desempregados) estão à procura de emprego há mais de dois anos, segundo o IBGE. Esse dado deveria soar o alarme dos órgãos públicos, porque são brasileiros que não sendo produtores, não serão consumidores, levando a um possível desmantelamento da engrenagem do comércio e da indústria. Ainda, essas pessoas ficam excluídas de muitos programas como o habitacional, podendo ficar inadimplentes caso estejam pagando prestações da compra a prazo, tanto de empreendedores imobiliários, quanto de instituições do governo, que, como se vê em editoriais, acabam por retomar os imóveis, no caso de inadimplência, causando despejos e aumentando o número de moradores de rua.
É, portanto, oportuna e necessária, a retomada de um pleno emprego, quando toda a economia voltará a se mover. Não se tem certeza de que os que dormem ao relento estarão capacitados a ocupar um posto de trabalho, pois muitos não tiveram a oportunidade de sequer ter concluído a escola fundamental. Necessitaríamos de um censo voltado exclusivamente para esses indivíduos para podermos desenvolver programas públicos específicos de recondução ao mercado de trabalho, direcionados, exclusivamente, aos moradores de rua.
É um longo caminho? Talvez seja. Todavia, se nada for feito, em breve essa parcela da população será maior e ainda mais desvalida, e, com certeza, a situação afetará a todos, com aumento de violência física e mental. Outra solução a longo prazo é a mudança do atual modelo econômico em vigor, como o papa Francisco, em prédica, manifesta sua preocupação com o que acontece em todo o mundo — o aumento da pobreza. Por certo, o religioso vê os prejuízos materiais como a miséria, a pobreza e a fome afetando os fiéis ou agnósticos em sua totalidade. Seria como um vírus que se alastra em todos os continentes.
Vejamos se os governos podem, junto com a iniciativa privada, tomar as medidas cabíveis para atenuar ou acabar com todos os problemas que disso surgem. Os desvalidos e a comunidade como um todo agradecerão.
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