Por Xisto Vieira Filho - Presidente da Associação Brasileira de Geradoras Termelétricas (Abraget)
Todos nós já tivemos oportunidade de ler fábulas, histórias infantis que sempre procuram transmitir uma mensagem ou ensinamento. Recordo bem de uma delas que tratava sobre a corrida entre uma lebre e uma tartaruga. Na disputa, a lebre estava tão segura de sua vitória que resolveu dormir um pouco e deixar a tartaruga ir andando naquele seu passo lento. E os deuses das fábulas fizeram a lebre dormir demais e, assim, perder a corrida.
Essa história pode ser facilmente adaptada a uma fábula que trate sobre uma corrida tecnológica entre uma lebre especial e um jabuti, do tipo jabuti-piranga, uma das espécies mais conhecidas e comuns no Brasil. A lebre, que adorava o calor e costumava dormir de dia e ser ativa à noite, iniciou estudos para modernização de diversas fontes de energia e simplesmente desprezou os estudos do jabuti. Achava que eram improváveis, caros e de aplicação reduzida.
E todos os participantes dessa selva (ou quase todos) achavam que o jabuti realmente teria que ser extinto, uma vez que não trazia alegrias. E a lebre, essa sim, deveria ser consagrada, por ser dona da melhor tecnologia, além de ser feliz, veloz e engraçada, motivo até de desenhos animados. E, como em toda fábula, o inverso é o que acontece: o jabuti ganhou a corrida tecnológica. Com uma diferença bem grande da lebre.
No setor elétrico, diversos profissionais que têm como hobby opinar sobre essa indústria resolveram caracterizar as termelétricas como jabutis. Julgam que essas usinas aparecem do nada e que não fazem parte de estudos de planejamento de longo prazo. E tudo isso porque seriam poluentes, "caras" e sem tanta finalidade assim. Afinal, poderiam ser facilmente substituídas por reforços na transmissão e compensadores síncronos. Ao ouvir isso, os nossos queridos Concordia, Steinmetz, F. P. Melo, P. Kundur tremem em suas tumbas.
Mas vejam que interessante: enquanto muitos tentam eliminar, no futuro, a geração termelétrica por ser poluente, grandes fabricantes e pesquisadores desenvolvem e implantam tecnologias para tornar essas usinas totalmente verdes. Soluções como o Ccus (captura, utilização e armazenamento de carbono) estão em escala quase comercial. Sim, térmicas com essas tecnologias estão operando nos Estados Unidos, Canada, Noruega, China, entre outros países. Só na China existem mais de 60 projetos de termelétricas com Ccus a serem implantados até 2030.
O custo ainda é elevado? Claro que sim. E essa é a trajetória de qualquer tecnologia. Os custos vão caindo à medida que mais e mais projetos entram em operação, e a tecnologia matura, se aprimora. Isso sem falar que usar Ccus será, sem dúvida, é mais econômico e eficaz do que investir bilhões de dólares em linhas de transmissão e compensadores síncronos que, aliás, nem geram energia. Além disso, temos o uso do hidrogênio em térmicas, que está sendo testado em unidades dos principais fabricantes. A utilização desse combustível em termelétricas e? outra quebra de paradigma próxima de acontecer. Com novas tecnologias e combustíveis, poderemos, muito mais rápido do que se pensa, introduzir a confiabilidade verde nos sistemas elétricos.
E no Brasil não será diferente. Imaginem que no Sistema Sul, onde o carvão é uma riqueza natural e tem muito valor socioeconômico para a região, poderemos produzir um carvão verde. Ou as usinas movidas a gás natural, que têm mercado maduro e grande riqueza no pré-sal, gerar gás verde — 2030, 2040 é logo ali. E até as térmicas a óleo poderão continuar a prestar seus serviços auxiliares e ancilares. Enfim, deixem a lebre dormir, pois o jabuti vai chegar na frente e disparado. Então, quem sabe, passem a chamar os jabutis de leões, os bichos que cuidam da segurança da selva.
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