opinião

Artigo: Um grande "não" às armas

Rodrigo Craveiro
postado em 08/06/2022 06:00
 (crédito: Nicholas Kamm/AFP)
(crédito: Nicholas Kamm/AFP)

"Não espero nada mais do que um sorriso. As dores do mundo fincam raízes em minha alma e criam galhos em meu coração. Queria poesia onde não existe rima, beijos onde se alojou o desprezo, flores coloridas de pássaros sobre a árvore de troncos secos e retorcidos pela dureza da vida. Não espero nada mais do que um olhar.

Farol a guiar meu espírito pelo infinito de meus dias até a inevitável despedida. Meu coração é céu estrelado de  lembranças do que ainda não veio. Meu espírito é rio que corre lento, tranquilo, até a foz de uma imensidão chamada Deus."

Escrevi esse poema, parte de um projeto do Facebook chamado Varanda de Mim, depois de dias de notícias ruins. Como jornalista, é impossível me distanciar da notícia. Era sábado e eu estava na Redação do Correio quando um supremacista branco invadiu um mercado, em Buffalo (Nova York), e fuzilou 13 pessoas. Dias depois, um estudante entrou em uma escola, armado com um fuzil, e ceifou a vida de 19 crianças e duas professoras, em Uvalde, no Texas. 

Às vezes, recorro à poesia como válvula de escape ante uma realidade por demais dura e cruel. Busco rima, mas tudo o que encontro, às vezes, são linhas vazias de dor. Procuro flores coloridas, e acabo as encontrando em memoriais dedicados a inocentes que foram roubados para sempre dos beijos e dos olhares de seus pais, cujas vidas tornaram-se galhos secos e retorcidos pelo luto. É hora de o ser humano entender que armas matam.

Não são pessoas que matam, como querem apregoar os amantes dos tiros. Armas foram feitas para matar. Na segunda-feira, li uma reportagem sobre uma criança de dois anos que matou acidentalmente o próprio pai, um homem de 26 anos, perto de Orlando, na Flórida. O menino encontrou a pistola em uma bolsa, no chão, apontou-a para o pai e disparou.

Tragédias como as de Buffalo e de Uvalde talvez fossem bem mais raras se houvesse um controle rígido sobre a venda de armas nos EUA. É controverso imaginar que, em um país marcado pela Justiça implacável, se ofereça a possibilidade de o cidadão adquirir armas de grosso calibre sob o guarda-chuva da Segunda Emenda à Constituição. É hora de as autoridades norte-americanas dificultarem a venda de fuzis.

Não venham com a ladainha de que é preciso arma para proteger a família. Bandidos não se furtam em apertar o gatilho sob a menor ameaça. Fiquei sob a mira de dois revólveres, em um sequestro relâmpago, e tenho a certeza de que estaria morto se estivesse com uma arma. É insano imaginar que o chefe de Estado apregoe a venda livre de fuzis no país.

O número de civis armados, no Brasil, chega a 605 mil e ultrapassa o contingente das Forças Armadas. Desde 2019, houve aumento de 260%. Prefiro uma vida em paz. Prefiro um céu estrelado de lembranças do que ainda não veio. E uma vida longa, tal qual rio a correr, lento e silencioso, em direção ao destino de todos. 

 

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