O governo decidiu cortar R$ 14 bilhões do Orçamento da União deste ano para garantir reajuste de 5% nos contracheques de todos os servidores federais. Vai sacrificar ainda mais as áreas de saúde, educação e ciência e tecnologia, que, sistematicamente, têm enfrentado contingenciamento de verbas. Por mais que o funcionalismo seja merecedor de uma correção salarial, não é justificável passar a tesoura em recursos de setores prioritários para a população e essenciais para o desenvolvimento do país. Mais uma vez, o Brasil faz as escolhas erradas.
Melhor seria se o governo tivesse optado por cortar verbas do Orçamento secreto, que não tem a menor transparência e vem sendo usado como moeda política. A previsão é de que esse instrumento de cooptação movimente, somente neste ano, R$ 16 bilhões. Além disso, deputados e senadores têm as emendas tradicionais, que também movimentam bilhões, e o Fundo Eleitoral, de quase R$ 5 bilhões. Com certeza, a maior parte desses recursos poderia ser limada da planilha de gastos do Tesouro Nacional. Mas o Palácio do Planalto não quer comprar briga com parlamentares em ano de eleições.
Ou seja, a fatura recairá, mais uma vez, sobre a população mais pobre, sempre a grande prejudicada. A saúde deverá perder mais R$ 2,5 bilhões. A educação poderá ficar sem R$ 3,2 bilhões, o que levará ao colapso universidades e institutos federais. Não haverá dinheiro nem para despesas básicas, alertam reitores e especialistas. A previsão é de que ciência e tecnologia deixarão de receber R$ 2,9 bilhões. Pelos cálculos da Academia Brasileira de Ciências (ABC), 30 programas científicos serão paralisados, como projetos voltados ao enfrentamento da covid-19, ao combate a doenças negligenciadas e à colaboração a missões espaciais.
O resultado da falta de critério por parte do governo será mais filas em hospitais e postos de saúde, universidades paradas e menos pesquisas, ainda que a busca pelo conhecimento seja fundamental para o desenvolvimento de qualquer nação. Na avaliação do Palácio do Planalto, no entanto, isso não é nada. O que realmente importa neste momento é manter a base governista unida, destinando verbas para compras superfaturadas de tratores, para programas de robótica em escolas que nem existem e para atender pedidos de pastores que oferecem barras de ouro em propina.
De nada adianta o governo dizer que os cortes no Orçamento são necessários, pois os servidores estão sem aumentos salariais há anos. Parcela significativa dos trabalhadores da iniciativa privada também está, e muitos perderam os empregos — são mais de 11 milhões de desempregados —, enquanto o funcionalismo mantém a estabilidade. A tendência é de que, com o reajuste aos funcionários federais, a desigualdade no mercado de trabalho fique ainda maior, num quadro gravíssimo de inflação. Não é esse, com certeza, o caminho para uma distribuição mais justa dos impostos pagos pelos contribuintes.
Os brasileiros indignados com o descaso no manejo do Orçamento da União terão uma grande oportunidade de tentar mudar tal realidade nas eleições de outubro próximo. Que, na hora de cravar os votos nas urnas, os eleitores optem por legisladores comprometidos com questões que realmente favoreçam os mais necessitados e não por aqueles que desejam manter os privilégios a poucos. O Orçamento precisa deixar de ser uma obra de ficção para representar o desejo da maioria de um Brasil menos desigual, em que saúde, educação e ciência e tecnologia sejam prioridades, não penduricalhos quando se está falando de verbas públicas.