Poucos valores são inegociáveis. A liberdade e a democracia são alguns deles. Liberdade de expressão não significa disseminar fake news, ódio e virulência nas redes sociais. Liberdade é um conceito supremo. Ser livre para se manifestar, dentro dos limites da lei e da ética. Ter uma sociedade cuja imprensa seja livre para investigar, apurar, denunciar e fiscalizar os poderes da República. Expor os desmandos e a corrupção, cobrar punição. Sem o cerceamento do Estado e sem as amarras autoritárias. A censura violenta o segundo valor: a democracia. O silêncio tem preço alto. A sociedade amordaçada corre o risco de ser carcomida pelo autoritarismo e de ter os olhos vendados para os excessos e as mazelas do governo.
Exigir o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF) e caluniar ministros da esfera mais alta da Justiça não são atos de liberdade. Muito menos democráticos. A existência e a separação dos três Poderes da República são condição sine qua non para um Estado saudável. Assim como o sistema de freios e contrapesos, o controle do poder pelo próprio poder, algo essencial para impedir a instalação de uma tirania.
Nos últimos dias, as ilações de que a urna eletrônica estaria sujeita a fraudes e o convite para militares fiscalizarem as eleições soam como ameaças reais a uma democracia jovem, imatura e valiosa. Certo seria um chefe de Estado não colocar em xeque a própria estabilidade institucional. O correto seria o presidente da República agir como fiador e tutor da Constituição. A existência do voto é a própria tradução da democracia. Qualquer tentativa de macular a vontade popular pode provocar consequências indesejáveis e nefastas. A lisura e a transparência das eleições, que levaram ao Planalto inclusive o atual mandatário e seus antecessores, não deveriam ser questionadas. Isso equivaleria colocar em xeque a legitimidade dos governos eleitos pela urna eletrônica — em vigor desde 1996.
Não à toa, o sistema de votação eletrônica é modelo para o mundo inteiro, em razão da segurança e da agilidade no processamento de dados. Qualquer contestação dele deveria se basear em fatos, não em proselitismo político ou em uma tentativa de inflamar o eleitorado para questionar o resultado das urnas. Se o governo não faz a parte dele, cabe aos brasileiros zelarem pela democracia. Que ela afaste de nós o cálice do autoritarismo e da opressão. Que os demais poderes da República tenham a sabedoria necessária para impedir que o Brasil retroceda em quatro décadas até tempos obscuros e perigosos.