JOSÉ PASTORE - Professor da Universidade de São Paulo e Presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomércio-SP. É membro da Academia Paulista de Letras
"Gosto muito de você, mas as coisas que você sabe fazer não têm mais utilidade para esta empresa. Mudamos muito. Lamento, mas tenho que O dispensar." A obsolescência humana é uma das maiores tragédias dos dias atuais. Isso ocorre porque as empresas passam por um meteórico processo de mutação, que exige uma atualização continuada no campo das competências técnicas e socioemocionais. O Fórum Econômico Mundial (Davos) estima que, até 2030, o mundo terá de requalificar 1 bilhão de trabalhadores para mantê-los trabalhando. As estratégias seguirão caminhos variados. Mas, como regra, a atualização profissional exigirá uma íntima interface entre escolas e empresas.
Os países avançados descobriram esse caminho há muito tempo. Alemanha, Áustria, Suíça e outras nações avançadas consolidaram o sistema dual de ensino e trabalho por meio do qual os jovens ficam parte do tempo na escola e parte na empresa em regime de aprendizagem. As novidades que surgem na empresa são levadas à escola que as inclui nos currículos. Os conceitos básicos ensinados na escola formam o alicerce para a aprendizagem na empresa.
Dessa parceria, beneficiam-se os jovens que apreendem e se atualizam e as empresas que observam os jovens por um bom tempo antes de contratá-los de forma definitiva.
As pesquisas que levam em conta custos e benefícios para as empresas mostram as grandes vantagens do sistema de aprendizagem (Samuel Muehlemann e Stefan C. Wolter, Return on investment of apprenticeship systems for enterprises, Bonn: IZA Journal of Labor Policy, 2014). Com um bom sistema de aprendizagem, as empresas recuperam o que gastam no momento em que contratam os jovens como empregados fixos.
Nos dias atuais, está ficando cada vez mais claro que a aprendizagem tem de ser um processo permanente na vida dos profissionais. Isso vale para todos os países. Por isso, o Brasil precisa aumentar o número de aprendizes nas empresas e, para tanto, manter e ampliar os estímulos para que continuem sendo contratados com todas as proteções da CLT e com redução de custos para as empresas como reza a Lei 10.097/2000.
Com o Decreto 11.061/2022 e da Medida Provisória 1.116/2022, o governo federal busca estimular a aprendizagem por meio de várias inovações, dentre as quais, destaco as seguintes: (1) ampliação do período de aprendizagem para 3 anos e, em certos casos, 4 anos; (2) elevação dos limites de idade para permitir a contratação de aprendizes em atividades até então inviáveis; (3) para as empresas, contagem em dobro da cota para jovens aprendizes carentes, deficientes e vulneráveis; (4) articulação da adoção de aprendizes nas empresas contratantes e contratadas no caso de terceirização; (5) disponibilização de experiências exitosas no campo da aprendizagem e implementação dos Programas de Reconhecimento de Boas Práticas e de Incentivo à Contratação de Aprendizes, que inclui premiação aos parceiros que mais se destacam nesse campo.
É claro, uma coisa é a intenção, outra, a ação. Teremos de esperar o curso do tempo para avaliar a eficácia desses estímulos. Mas o importante neste momento é o reconhecimento da importância da aprendizagem e a oferta dessas oportunidades para o Brasil salvar mais jovens da terrível obsolescência que ocorre com quem fica defasado no campo do trabalho. Tais providências são particularmente relevantes neste momento de grave crise econômica, social e sanitária. Precisamos reduzir as vulnerabilidades dos jovens, pois são os que mais sofrem as agruras do desemprego, da rotatividade e da informalidade. Ao mesmo tempo, são os que vão tocar nossas vidas amanhã.