Nas relações internacionais, a palavra que se sobrepõe é "pragmatismo". Muitas vezes, os países tomam decisões polêmicas ou até mesmo moralmente questionáveis se forem benéficas a seus interesses. Na semana passada, na contramão da comunidade internacional, a China reforçou os laços de amizade com o Kremlin, apesar do isolamento crescente da Rússia — em retaliação à invasão da Ucrânia. O porta-voz da chancelaria chinesa, Zhao Lijian, declarou que China e Rússia se mostram "superiores" ao "modelo da aliança política e militar da era da Guerra Fria".
Segundo Lijian, Pequim e Moscou se comprometeram a desenvolver um "novo modelo de relações internacionais baseado na não aliança, na não confrontação e em não visar terceiros países". O objetivo do fortalecimento da amizade entre Rússia e China seria, além de impulsionar os interesses comerciais envolvidos, minar a hegemonia dos Estados Unidos e da Europa, e colocar-se como novo eixo de influência na ordem mundial. As duas nações se aproveitam da fragilidade política de Joe Biden para confrontar a potência ocidental.
Especialistas admitem que um rearranjo geopolítico deverá surgir da invasão à Ucrânia. Talvez uma nova polarização entre Ocidente e Oriente, entre o capitalismo e os sonhos do socialismo. Uma "Guerra Fria" nos moldes do século 21. Detalhe: Rússia e China, assim como os Estados Unidos, são potências nucleares. A cooperação sino-russa tem outro viés, não menos pragmático. A China vê a tentativa da Rússia de controlar a região do Donbass (leste da Ucrânia) como uma forma legítima a ser replicada na ilha de Taiwan, que segue o modelo democrático e capitalista. Pequim tem ameaçado Taipei de invasão, caso os taiwaneses busquem a independência.
O pragmatismo na política externa pode ter preço. Os Estados Unidos alertaram, reiteradas vezes, que punirão a China, caso ela ofereça algum tipo de concessão à Rússia na guerra à Ucrânia — incluindo a suavização das sanções internacionais. A questão é saber se Biden teria cacife político e estaria disposto a correr riscos para confrontar o regime de Xi Jinping e seu Partido Comunista Chinês. O tensionamento entre Washington e Pequim tem aumentado nos últimos anos, principalmente por disputas comerciais.