A Doutora (com D maiúsculo) Nise da Silveira é um orgulho que a brasilidade deve saudar todos os dias. Foi a responsável por humanizar aquilo que um dia se chamou de manicômio. Antes, devido aos dogmas e à lentidão na pesquisa científica, os internos eram jogados e entregues à própria sorte em grandes depósitos de gente, quando não submetidos a tratamentos que, hoje se sabe, mais mal faziam do que bem. O debate sobre a saúde mental e o impacto na sociedade avançou por causa da Doutora Nise — que continua a ser referência no assunto em qualquer parte do mundo.
Amante dos gatos, morreu aos 94 anos, lúcida e consultada pelos maiores especialistas que vieram depois dela. Foi aluna de Carl Gustav Jung, um dos grandes nomes da psicanálise. Passou a vida abraçada à ciência — e à política.
Foi casada com Mário da Silveira, médico e alagoano como ela, e dirigente do Partido Comunista Brasileiro. Doutora Nise também era comunista e, como o marido, esteve encarcerada na Ilha Grande, durante o Estado Novo, com os inimigos do regime. Era amiga de Graciliano Ramos, outro alagoano, comunista e preso político. Tudo isso o Grande (com G maiúsculo) Graça conta em Memórias do Cárcere — uma obra importantíssima para se entender a política brasileira.
Em 27 de abril, o Senado homenageou a Doutora Nise ao indicá-la para ser inscrita no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria. Jair Bolsonaro, porém, vetou — porque ela era comunista. Pequeno e ressentido, cercado de ignorantes, no despacho deixa clara a razão da recusa: "Ademais, prioriza-se que personalidades da história do país sejam homenageadas em âmbito nacional, desde que a homenagem não seja inspirada por ideais dissonantes das projeções do Estado Democrático".
Em outro trecho, a argumentação para o veto vem carregada de cinismo e sordidez: "Não é possível avaliar a envergadura dos feitos da médica Nise Magalhães da Silveira e o impacto destes no desenvolvimento da Nação, a despeito de sua contribuição para a área da terapia ocupacional".
Bolsonaro tem ódio da ciência, desprezo pelo pensamento, horror à intelectualidade, ojeriza à humanidade. É inimigo declarado da evolução, que tenta desesperadamente impedir. Doutora Nise é o extremo oposto e, talvez, em outros tempos, o acolheria e o ajudaria — porque quem tem envergadura não discrimina.
Doutora Nise representa a grandeza. Bolsonaro, o vazio, o nada.
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