Em um bilhete, entregue ao monitor do transporte escolar, a menina, de 10 anos, pediu socorro: "Me ajuda, eu estou sofrendo abuso sexual do meu pai". A violência já durava havia cinco meses e ocorria dentro da própria casa dela, quando a mãe, diarista, saía para trabalhar. O miserável era o padrasto, a quem a criança chamava de pai porque convivia com ele desde muito pequena. Exames atestaram estupro de vulnerável consumado.
O papel também foi a forma usada por duas irmãs, de 6 e 8 anos, para denunciar o pai estuprador. Num caderno, desenharam o que o covarde fazia. As imagens são aterradoras. Elas ainda escreveram: "Mãe, ele me obriga a fazer isso". E a palavra "socorro". O desgraçado ameaçava machucá-las ainda mais se contassem. O depoimento de uma delas à polícia é de doer na alma. A criança disse que, em uma das ocasiões, ouviu a irmã chorando e pedindo ao pai que parasse, o que ele não fez. Também revelou que tentava escapar dos abusos urinando em si mesma quando ficava sozinha com ele, porque o canalha tinha nojo de urina.
É muito sofrimento. Crianças enfrentando sozinhas tamanha violência. Inimagináveis as dores físicas e psicológicas que as levaram a implorar, da maneira como puderam, para serem salvas. E salvas de quem tinha o dever de mantê-las protegidas, de ser um porto seguro.
As vítimas que não pedem ajuda diretamente — por medo, trauma, sentimento de culpa ou vergonha —, emitem sinais de que estão em profundo padecimento. Entre os indícios de abuso estão, ansiedade, insônia, depressão, irritação, perda de apetite, dores de cabeça e de barriga, pesadelos frequentes, queda de rendimento escolar, xixi na cama, comportamentos sexuais.
Cabe aos adultos identificar os sinais, apoiá-las incondicionalmente para que se sintam seguras, jamais duvidar de seus relatos e denunciar os agressores — não raro a família adota pacto de silêncio quando a barbárie é cometida por algum de seus integrantes, o que revitima meninos e meninas. As denúncias podem ser feitas pelo Disque 100, o aplicativo Proteja Brasil, o site Humaniza Redes ou em conselhos tutelares e na polícia.
Combater atrocidades contra crianças e adolescentes tem de ser uma bandeira nacional. Envolver família, sociedade e Estado. O governo federal anunciou, ontem, algumas ações, por causa do Maio Laranja. Não basta. O enfrentamento tem de ser efetivo e diário. Meninos e meninas pedem socorro todos os dias, mas continuamos a fazer ouvidos moucos e vista grossa.
Saiba Mais
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.