Raul Velloso - Economista
Na década de janeiro de 2004 a dezembro de 2013, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro crescia em média a 3,9% ao ano, após longo período em que as altas taxas dos anos setenta caíam sistematicamente em nosso país. Na sequência, do início de 2014 até há pouco, em um período de cerca de 8 anos, a taxa média desabou, com queda de 0,6% ao ano, tendo-se a sensação de que, hoje, novo governo se formando à frente, as forças políticas se vêm sem qualquer ideia bem concebida sobre o que fazer para o Brasil voltar a crescer a taxas razoáveis pelos nossos padrões.
Nesse contexto, tenho insistido na tese de que o país não voltará a crescer a taxas elevadas se não encontrar os caminhos para investir bem mais em infraestrutura, seja no setor público, seja no setor privado. Pasmem, entre o final dos anos oitenta e 2018, enquanto as inversões privadas nesse setor eram, em média, de 1,2% do PIB anual, as públicas desabaram sete vezes, quando medidas em percentual do PIB, e, com elas, despencou o próprio crescimento econômico. E, para ficar seguro sobre o que tenho dito, carrego sempre comigo um gráfico que mostra duas linhas praticamente coladas, uma para o investimento total em infraestrutura e, outra, para a taxa de crescimento do PIB. Cai uma, logo cairá a outra.
Como explicar a queda dos investimentos que se observa igualmente em todas as esferas de governo e identificá-la como a tendência a se inverter primordialmente? Basicamente, porque é o item menos rígido dos orçamentos e, assim, com as pressões para fazer ajuste fiscal que vieram se formando à medida que os deficits públicos por vários motivos subiam (assunto para outra coluna), os investimentos acabaram se tornando o item que pesa menos no total. É curioso que, depois de se ter criado esse famigerado "teto dos gastos", instrumento de contenção que deveria ser aplicado ao conjunto dos itens igualmente, e tido ainda hoje por muitos como salvação da pátria, não se parece ter percebido que 95% do total já eram compostos de gastos obrigatórios legalmente, praticamente impossíveis de ajustar a não ser a longo prazo.
Se boa parte da saída é desafiar as prioridades de gasto público hoje estabelecidas, destinando menos recursos a despesas correntes, qual deveria ser o item do gasto obrigatório a prioritariamente ajustar? Simples: exatamente onde predominam as maiores injustiças sociais, ou seja, as supergenerosas aposentadorias e pensões do setor público, que, aliás, têm crescido absurdamente nas últimas décadas.
Aqui vale a pena citar o exemplo concreto do estado do Rio de Janeiro como um caso a estudar e acompanhar, tirando o máximo possível de lições. Ainda que premiado pela nova receita pública derivada do petróleo, o Rio é, de longe, o estado em situação financeira mais delicada do país. A dívida pública estadual e obviamente seu serviço são muito altos; os gastos previdenciários dispararam acima da média nacional; e, por último, em consequência disso, os investimentos públicos em infraestrutura vêm caindo bastante, minando as possibilidades de crescimento do estado que sejam oriundas das próprias ações.
Com base em 2020, o grosso da dívida é com a União, e corresponde a 3,2 vezes a receita corrente líquida fluminense, sendo esse o maior valor da série disponível. Os políticos locais reclamam do fato de o estado ter de se enquadrar no Programa de Recuperação Fiscal (PRF), algo que alivia de um lado, mas aperta do outro.
Os altos gastos previdenciários são devidos a questões demográficas ou mera decorrência do que ocorre com os costumeiramente crescentes pagamentos aos ativos. Entre 2007 e 2017, e em termos reais, os gastos previdenciários do Rio cresceram absurdos 162,4%, enquanto a média estadual subia bem menos: 87,4%. Em contraste, o PIB real global, nesse mesmo período, acumulava queda de 6,6%. Ou seja, como é a arrecadação que, em decorrência da evolução do PIB, cria o combustível natural para financiar quaisquer gastos, tem existido uma completa incompatibilidade entre as trajetórias da receita e da despesa.
Pior que isso, se nada for feito além de soluções pontuais, e com base nos estudos atuariais disponíveis, os crescentes gastos previdenciários acabarão provocando, em breve, a zeragem do espaço para investir no orçamento do Rio, investimentos esses que já desabaram, em termos reais, de R$ 10,5 bilhões, em 2013-14, para R$ 1,1 bilhão em 2019-20, a preços de 2020. Estou refazendo minhas projeções para, em breve, divulgar o ano mais provável dessa iminente zeragem, caso nada se faça para evitá-la.
Conforme acima sinalizado, parte da salvação da crise fluminense está vindo do aumento da receita média com royalties, que, a preços de 2020, haviam desabado de R$ 6,3 ao ano entre 2007 e 2014, para R$ 2 bilhões médios em 2015-16 e, ao final, tinham subido para a média de R$ 9,5 bilhões, entre 2017 e 2020. Só que, como há pouco a fazer nessa área a menos de suavizar a curva de receita respectiva, há muito o que fazer em matéria de reforma previdenciária, entre outras ações correlatas.
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