Eis-nos aqui, mais uma vez, diante de uma crise institucional gerada pela falta de harmonia entre os Três Poderes. Em cena estão: o ativismo político das altas cortes do Judiciário ou a politização da Justiça e o seu oposto, representado pela judicialização da política, com a perda das prerrogativas constitucionais do Legislativo.
No meio desse banzé, entra o Poder Executivo no papel de refém do Congresso, por meio do presidencialismo de coalizão ou, mais precisamente, do que pode ser chamado hoje de presidencialismo de bancada, com o protagonismo do nebuloso Centrão. Interessante é verificar que nesse casamento triplo e aflitivo, nenhum dos cônjuges tem um naco sequer de razão ou ausência de culpa.
O perdão aos crimes de injúria, difamação e ameaças, cometidos pelo deputado do Rio de Janeiro Daniel Silveira contra ministros do Supremo e contra as instituições democráticas — uma questão que poderia ser equacionada numa reunião entre os presidentes da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal, acertando e aparando arestas — ganhou dimensão pelo atual estado de frisson em que vivem os Poderes da República, apenas porque nenhum deles parece conhecer o que estabelece a Constituição.
O fato importante, em mais esse episódio desnecessário e obtuso, é que essas instituições republicanas vêm perdendo, ano a ano, seu principal lastro, que são a credibilidade e o respeito da nação. De nada adiantam os tratamentos cerimoniosos usados por vossas excelências e os salamaleques feitos diante das câmeras, se, nas relações institucionais entre esses atores, o script redigido em 1988 na Constituição não é seguido à risca. Por certo, não existe bandidos nesse tiroteio generalizado, mas também não há mocinhos ou personagens isentos de erros.
Estamos hoje, sem dúvida alguma, diante da mais sofrível e penosa composição ou elenco de atores distribuídos nos Três Poderes, o que explica, em parte, as seguidas crises. Para quem entende de cinema, o que se vê é um autêntico filme de Ed Wood, considerado o pior cineasta de todos os tempos. Surpresa mesmo é que toda essa instabilidade infantil não tenha degenerado numa solução mais radical, semelhante a acorrida em março de 1964.
A questão toda é que a Câmara dos Deputados não agiu a tempo e como manda seu regimento interno. O Supremo decidiu, em tempo recorde, mas muito além de seu mister. O Executivo agiu antes da finalização oficial do julgamento e de modo figadal, com justificativas aquém do que requer a didática jurídica. Estamos diante de uma crise, que, por incrível que pareça, é muito maior do que cada um dos personagens envolvidos nessa questão. Surpreende que anões políticos sejam capazes de provocar um conflito dessa proporção.
Com relação ao pivô desse despautério político, ao deputado pelo Rio de Janeiro poderia caber punição exemplar, só pelo fato dele não trabalhar, como se espera de um parlamentar, pela cidade que o elegeu. Em vez disso, fica criando distúrbios do tipo rufião, agitando o cenário com seus músculos, quando, na verdade, deveria estar usando o cérebro em favor dos cariocas. Triste país e triste nação quando homens públicos são escolhidos por cérebros encolhidos.
» A frase que foi pronunciada
"Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos."
Carta Magna
Viver direito
Geraldo Vasconcelos foi entrevistado pelo programa Viver Direito. Uma homenagem justa a esse pioneiro advogado e corretor de imóveis. Veja a entrevista na íntegra no Blog do Ari Cunha.
Salvador dali e de lá
Uma das cenas mais bizarras desta eleição será, se acontecer, Simone Tebet abandonar a própria candidatura para apoiar o PT. Começa a ser estranha a declaração sobre o indulto ao parlamentar da Câmara dos Deputados. A impressão que dá é que ela está fazendo o logoff Tebet e o login MDB.
Decisão
A Austrália anunciou que não vai impugnar a decisão da Justiça do Reino Unido em extraditar um jornalista. Agora, tudo depende da assinatura da ministra do Interior da Inglaterra, Priti Patel. O juiz Paul Golpring, da Corte de Magistrados de Westminster, entregou o documento para o despacho.
Lembrança
Lembrança de Roberto Campos sempre atualizada: "Chega-se à conclusão que nós estamos na terceira categoria dos povos segundo o chanceler de ferro, Bismark. Ele classificava os povos em três grupos: aqueles que aprendem com a experiência alheia, esses são os inteligentes; aqueles que aprendem com sua própria experiência, esses são os medíocres, e o terceiro grupo, os idiotas, aqueles que não aprendem".
» História de Brasília
O professor Soriano Neto, que, dizem, inspirou o desenhista Péricles a criar o Amigo da Onça, foi, ontem, exonerado do cargo de diretor da Faculdade de Direito do Recife. (Publicada em 21/2/1962)