Editorial

Visão do Correio: Petrobras temas suas defesas

A Petrobras é a maior empresa brasileira e tem sua história marcada pelo idealismo e determinação dos tempos pós-Segunda Guerra Mundial e por um grau de eficiência tecnológica e operacional reconhecida em todo o mundo. O desempenho da estatal no ano passado mostra o peso da companhia na economia brasileira. A empresa fechou 2021 com uma receita líquida de R$ 452,7 bilhões, apurando lucro líquido recorde de R$ 106 bilhões, repassando R$ 72,7 bilhões aos seus acionistas na forma de dividendos. Com valor de mercado de R$ 437,7 bilhões no fim de março, a Petrobras produz 2,77 milhões de barris de equivalentes de petróleo e gás por dia e processa em suas refinarias cerca de 80% do óleo extraído nas plataformas marítimas espalhadas ao longo da costa brasileira. O número de empregados, que vem caindo nos últimos anos, corresponde a um contingente maior que a população da grande maioria dos 5.570 municípios brasileiros. A estatal emprega 45 mil trabalhadores, enquanto 3.770 cidades do país têm menos de 20 mil habitantes.

Nos últimos anos, seja por escândalos de corrupção, seja por aumentos seguidos e expressivos nos preços dos combustíveis, se criou no imaginário dos brasileiros o conceito de uma empresa usada por políticos como cabide de indicações em troca de favorecimentos em projetos e destinação de recursos, muitas vezes de formas pouco republicanas e seguindo preceitos éticos. E ainda de uma empresa ineficiente. Os problemas seriam um motivo para que se privatize a Petrobras. Independentemente de qual a melhor forma de se gerir a exploração e produção de petróleo e combustíveis no Brasil, é preciso que fique claro que o problema não está na empresa, mas sim na forma como o estado lida com os seus ativos.

E aqui cabe um parêntese, isso não significa que a o Estado não sirva para administrar e se deva transferir o controle da empresa para a iniciativa privada. É preciso mudar a forma como o Estado encara suas estatais, que são, na realidade, empresas muito mais públicas, porque, apartadas das funções básicas do estado, são patrimônio de toda a sociedade e como tal é que devem ser encaradas. As estatais são capazes de influenciar o desenvolvimento econômico e o nível de bem-estar da população e, assim, devem permanecer, seja sob o guarda-chuva do Estado, seja na iniciativa privada sob tutela de regras de interesse da sociedade como um todo, o que inclui mais do que os acionistas em primeiro lugar.

O desenrolar da troca de comando na Petrobras mostra o quão protegida a estatal está das interferências políticas como a efetuada agora pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). Insatisfeito com aumento dos preços dos combustíveis — depois de 57 dias em alteração, gasolina, diesel e gás de cozinha subiram 18,8%, 24,9% e 16,1%, respectivamente —, Bolsonaro decidiu pela demissão do presidente da empresa, general Joaquim Silva e Luna, o que levou o almirante Eduardo Barcellar Leal Ferreira a anunciar sua renúncia ao cargo de presidente do Conselho de Administração da estatal. Praticamente uma semana antes da Assembleia-Geral Extraordinária convocada para efetivar a troca, em 13 de abril, os dois indicados, Rodolfo Landim (para presidência do Conselho) e o economista Adriano Pires (para a presidência da empresa), desistiram dos cargos.

Em poucos dias, Landim e Pires tiveram suas vidas investigadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e por comitê interno da Petrobras, que conta com uma diretoria de Governança Corporativa e nela ficou claro a resistência aos dois nomes, principalmente o de Adriano Pires, que presta a consultoria a empresas concorrentes da Petrobras no setor de petróleo e gás. Pires desistiu por haver conflito de interesses entre suas atividades no setor privado e o comando da petrolífera brasileira. Landim diz ter optado por fortalecer o Flamengo, time de futebol que preside. Certo é que, desde 2016, a Lei 13.303/2016, aprovada exatamente para reduzir problemas decorrentes de interferências político-partidárias, trouxe para dentro das estatais as ferramentas de governança corporativa. A Petrobras tem mecanismos para se defender da ação de políticos cujas decisões interferem nos interesses da companhia.

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